10.3.03

Prenúncio

A festa acabou e as nuvens se reúnem.
Sopra o vento da destruição, com um cheiro
enganador de água fresca.
Eu contemplo o chão sujo, os restos de falsa doçura
os cascos opacos escarrando espuma e ranço
e algo me golpeia com força o peito: a falta de você.

Toda a casa treme; das janelas recém-consertadas
desprega-se a massa nauseabunda.
As folhas fossilizadas são as únicas que dançam
-- como nós dançamos naquela noite --
e beijam os outrora elegantes umbrais
como eu beijei tua nuca no fim da canção.

E as tábuas suplicam para voar livres como as folhas,
exatamente como gemeste ao desprender-te de meu abraço
e fugiste.

Só que tua alma ficou.
E ela não me deixa superar o desejo de ti.
Estou enlouquecendo de amor,
como a casa tudo faz para entregar-se ao vento,
mesmo sabendo que no fim da espiral
não há nada a não ser uma lembrança, um espasmo
mecânico
maquiavélico
mefistofélico.

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