Ontem realizei um sonho antigo: cumprimentei pessoalmente o grande escritor argentino Ernesto Sabato. Ele esteve no Rio para duas conferências na Universidade Cândido Mendes. A segunda, a que assisti, foi "Confissões de um escritor", e, segundo o professor Cândido Mendes, que apresentou e comentou a conferência, será publicada por aqui com certeza. Sabato está velhinho, com 90 anos, e pode ter sido uma das últimas oportunidades para ver o autor de clássicos como "O Túnel" e "Sobre Heróis e Tumbas". Fiquei comovido com sua fidelidade a seus ideais, ele que largou a Física para se dedicar à Literatura e sustenta que a razão não serve para orientar nossas vidas, não consegue conter coisas como a solidão, o absurdo, o amor e a morte. Sabato contou que largou a ciência ao descobrir que o mundo não está lá fora, mas dentro de nós; comentou que as idéias jamais existem em estado puro, como querem os filósofos e os cientificistas, mas estão sempre mescladas a alguma emoção; e sustentou que a educação não deve formar meros profissionais, mas homens, na mais ampla tradição do humanismo. Neste começo lamentável de milênio, foi um bálsamo ouvir as palavras, ainda que baixas e expressas com dificuldade, de um grande defensor da poesia e da esperança em meio ao caos. Foi com grande orgulho que subi ao palco e pedi que ele autografasse meu exemplar de "Antes do fim", seu recente livro de memórias. E não me cansei de olhar o autógrafo à noite e hoje de manhã. Larguei a biografia da Mary Stuart que estava lendo e mergulhei nas memórias de Sabato. Que homenagem maior poderia prestar-lhe?
Ao entregar-lhe o livro, disse-llhe apenas: "Para André". E ele respondeu, sorrindo: "Só isso? Não quer que escreva mais nada?" Eu respondi que não. Sabato olhou o livro, elogiou a beleza da edição brasileira e escreveu "Para André, com meu afeto, E. Sabato". Então eu apertei longamente sua mão (como suspeitava, ele tem um aperto de mão firme, que transpira confiança, como o do Verissimo) e declarei: "Foi uma grande honra estar aqui e poder conhecer o senhor. Obrigado". Não consegui falar mais nada. Mas Sabato apertou-me a mão mais fortemente e murmurou "muchas gracias". Depois, saí. Já ganhara meu presente de Natal. Para mim, foi como se cumprimentasse Wilde ou Nietzsche. Sabato é um dos Imortais de verdade, e estará sempre em meu coração. Sua Alejandra Olmos, de "Sobre Heróis e Tumbas", é a personagem feminina que mais amo em toda a literatura. Não tem para ninguém, nem Julieta, nem Madame Bovary. Ave, Sabato!
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