15.5.02

O DESTINO, O LIVRE-ARBÍTRIO E O DESEJO

CAPÍTULO VII


Rua General Glicério, 43. Um prédio antigo. Apartamento 902. O porteiro deu um mole, ele entrou. Elevador com porta pantográfica, assustador. Corredor às escuras. Frio. O vento da tarde chiava por entre basculantes enferrujados.
A campainha pareceu não funcionar. Ele bateu então na porta.
Um toc-toc veio caminhando hesitante para a porta. Mais alguns segundos e a chave começou a ser girada; de repente, parou.
­-- Quem é? ­-- Uma voz de homem, rouca.
­-- Um amigo de Daniela.
­-- Quem?
­­-- Jon. Vim lhe devolver um livro.
­-- Ah.
A chave terminou de girar. Surgiu um cego, segurando uma bengala de madeira bastante gasta. Óculos escuros, sem camisa, uma calça cinza desabotoada sob a barriga. Pele bem clara, cabelos grisalhos já rarefeitos.
­-- Boa tarde. Desculpe minha hesitação. O Rio de Janeiro anda violento demais.
­-- Não há o que desculpar.
­-- Sou Joachim, pai de Daniela. Prazer. Sinto, mas ela saiu.
­-- Jon Lord Oliveira. Vim deixar este livro com ela ­-- Depositou-o nas mãos do velho. ­-- Tudo bem, posso telefonar depois. Obrigado.
­-- Que livro é?
­-- É um da Simone de Beauvoir...
­-- Ah, o do conde Fosca, não é?
­-- Sim, é.
­-- Hum. Mais um.
­-- Mais um o quê, senhor?
­-- Oh, nada, nada. Eu só queria saber quantos anos iria viver o conde (se ele realmente existisse) se conhecesse Daniela.
­-- Parece uma questão interessante.
­-- Certamente o é. Mas não sei se você vai gostar de conhecer a resposta. Boa tarde.
O velho fechou a porta e Jon ficou parado ali, cismando.

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