Voltei. Ufa! Quarenta e oito horas de telecom depois, uma pausa para blogar ;-).
Lembro que hoje é quarta e estarei guitarreando com a galera do Estrada Fróes (Marcos na batera e Hélcio nos vocais e teclados) lá no ChoppGol (rua Felipe Camarão, 8, Vila Isabel, perto do Planeta Chop) das oito à meia-noite. Som na caixa!
Agora, outra pausa para um comentário do cadafalso: não é que ganhei uma amiga imortal? A Elis agora é acadêmica de Bom Jesus do Itabapoana, sua terra natal, e de Campos. É!!! Te cuida, Paulo Coelho... ;-)))
Ah, hoje é niver da querida tia Cora. Então, este poema vai para ela, com um beijo e desejos de muitas felicidades!!
Ode ao gato
(Pablo Neruda)
Os animais foram
imperfeitos,
compridos de rabo, tristes
de cabeça.
Pouco a pouco se foram
compondo,
fazendo-se paisagem,
adquirindo pintas, graça vôo.
O gato,
só o gato apareceu completo
e orgulhoso:
nasceu completamente terminado,
anda sozinho e sabe o que quer.
O homem quer ser peixe e pássaro,
a serpente quisera ter asas,
o cachorro é um leão desorientado,
o engenheiro quer ser poeta,
a mosca estuda para andorinha,
o poeta trata de imitar a mosca,
mas o gato
quer ser só gato
e todo gato é gato do bigode ao rabo,
do pressentimento à ratazana viva,
da noite até os seus olhos de ouro.
Não há unidade
como ele,
não tem
a lua nem a flor
tal contextura:
é uma coisa
só como o sol ou o topázio,
e a elástica linha em seu contorno
firme e sutil é como
a linha da proa de uma nave.
Os seus olhos amarelos
deixaram uma só
ranhura
para jogar as moedas da noite .
Oh pequeno imperador sem orbe,
conquistador sem pátria,
mínimo tigre de salão, nupcial
sultão do céu
das telhas eróticas,
o vento do amor
na intempérie
reclamas
quando passas
e pousas
quatro pés delicados
no solo,
cheirando,
desconfiando
de todo o terrestre,
porque tudo
é imundo
para o imaculado pé do gato.
Oh fera independente
da casa, arrogante
vestígio da noite,
preguiçoso, ginástico
e alheio,
profundíssimo gato,
polícia secreta
dos quartos,
insígnia
de um
desaparecido veludo,
certamente não há
enigma na tua maneira,
talvez não sejas mistério,
todo o mundo sabe de ti e pertences
ao habitante menos misterioso
talvez todos acreditem,
todos se acreditem donos,
proprietários, tios
de gato, companheiros,
colegas,
discípulos ou amigos do seu gato.
Eu não.
Eu não subscrevo.
Eu não conheço o gato.
Tudo sei, a vida e o seu arquipélago,
o mar e a cidade incalculável,
a botânica
o gineceu com os seus extravios,
o pôr e o menos da matemática,
os funis vulcânicos do mundo,
a casca irreal do crocodilo,
a bondade ignorada do bombeiro,
o atavismo azul do sacerdote,
mas não posso decifrar um gato.
Minha razão resvalou na sua indiferença,
os seus olhos têm números de ouro.
("Navegaciones y Regresos", 1959)
31.7.02
30.7.02
26.7.02
"É triste a minha Musa, como é triste
O sincero verter d'amargo pranto
D'órfã singela;
E triste como o som que a brisa espalha,
Que cicia nas folhas do arvoredo
Por noite bela.
É triste como o som que o sino ao longe
Vai perder na extensão d'ameno prado
Da tarde no cair,
Quando nasce o silêncio involto em trevas,
Quando os astros derramam sobre a terra
Merencório luzir.
Ela então, sem destino, erra por vales,
Erra por altos montes, onde a enxada
Fundo e fundo cavou;
E pára; perto, jovial pastora
Cantando passa - e ela cisma ainda
Depois que esta passou."
(Gonçalves Dias, "Primeiros Cantos", 1846)
O sincero verter d'amargo pranto
D'órfã singela;
E triste como o som que a brisa espalha,
Que cicia nas folhas do arvoredo
Por noite bela.
É triste como o som que o sino ao longe
Vai perder na extensão d'ameno prado
Da tarde no cair,
Quando nasce o silêncio involto em trevas,
Quando os astros derramam sobre a terra
Merencório luzir.
Ela então, sem destino, erra por vales,
Erra por altos montes, onde a enxada
Fundo e fundo cavou;
E pára; perto, jovial pastora
Cantando passa - e ela cisma ainda
Depois que esta passou."
(Gonçalves Dias, "Primeiros Cantos", 1846)
25.7.02
O show de ontem no ChoppGol deu certo e estarei lá todas as quartas (veja mais no Cadafalso II).
Hoje, alguns trechos do ótimo artigo "Desafios do Jornalismo", do professor Carlos Alberto Di Franco, publicado no Globo:
"As virtudes e as fraquezas dos jornais não são recatadas. Registram-nas fielmente os delicados radares da opinião pública. Precisamos, por isso, derrubar inúmeros mitos que conspiram contra a credibilidade da imprensa.
Um deles, talvez o mais resistente, é o dogma da objetividade absoluta. Inscrito em inúmeros códigos empoeirados, é de um vazio surpreendente. Transmite, num pomposo tom de verdade, a falsa certeza da neutralidade jornalística. Só que essa separação radical entre fatos e interpretações simplesmente não existe.
Jornalistas não são autômatos. Além disso, não se faz bom jornalismo sem emoção. A frieza é anti-humana e, portanto, antijornalística. Não se pode ouvir um corrupto com a mesma fleuma com que um inglês toma o chá das 5. A imprensa honesta e desengajada tem um compromisso com a verdade. A neutralidade é uma mentira, mas a imparcialidade é uma meta que deve ser perseguida. Todos os dias.
A busca da isenção enfrenta a sabotagem da manipulação deliberada, da preguiça profissional e da incompetência arrogante. O jornalista engajado é sempre um mau repórter. Não sabe, como sublinha o jornalista Carl Bernstein, que "o importante é saber escutar". Esquece, ofuscado pela auto-suficiência, que as respostas são sempre mais importantes que as perguntas. A grande surpresa no jornalismo de qualidade é descobrir que "quase nunca uma história corresponde àquilo que imaginávamos", sublinha Bernstein.(...)"
Hoje, alguns trechos do ótimo artigo "Desafios do Jornalismo", do professor Carlos Alberto Di Franco, publicado no Globo:
"As virtudes e as fraquezas dos jornais não são recatadas. Registram-nas fielmente os delicados radares da opinião pública. Precisamos, por isso, derrubar inúmeros mitos que conspiram contra a credibilidade da imprensa.
Um deles, talvez o mais resistente, é o dogma da objetividade absoluta. Inscrito em inúmeros códigos empoeirados, é de um vazio surpreendente. Transmite, num pomposo tom de verdade, a falsa certeza da neutralidade jornalística. Só que essa separação radical entre fatos e interpretações simplesmente não existe.
Jornalistas não são autômatos. Além disso, não se faz bom jornalismo sem emoção. A frieza é anti-humana e, portanto, antijornalística. Não se pode ouvir um corrupto com a mesma fleuma com que um inglês toma o chá das 5. A imprensa honesta e desengajada tem um compromisso com a verdade. A neutralidade é uma mentira, mas a imparcialidade é uma meta que deve ser perseguida. Todos os dias.
A busca da isenção enfrenta a sabotagem da manipulação deliberada, da preguiça profissional e da incompetência arrogante. O jornalista engajado é sempre um mau repórter. Não sabe, como sublinha o jornalista Carl Bernstein, que "o importante é saber escutar". Esquece, ofuscado pela auto-suficiência, que as respostas são sempre mais importantes que as perguntas. A grande surpresa no jornalismo de qualidade é descobrir que "quase nunca uma história corresponde àquilo que imaginávamos", sublinha Bernstein.(...)"
24.7.02
De volta ao som
Aí, galera: vou sacudir o pó da guitarra hoje para reestrear acompanhando o Hélcio, velho parceiro, cantor e tecladista, no ChoppGol, na r. Felipe Camarão, em Vila Isabel (perto do Planeta Chopp), a partir das oito da noite. Aos que conhecem minhas tendências roqueiras, aviso logo: o trabalho nada tem a ver com elas. É todo calcado em cima de MPB e bem leve, no esquema da noite mesmo. Hélcio toca de tudo, de baladas a sambas, e eu o sigo na guitarra (canto algumas músicas eventualmente e faço uns backing vocals em outras). Se tudo der certo, passarei a acompanhá-lo todas as quartas-feiras.
Aí, galera: vou sacudir o pó da guitarra hoje para reestrear acompanhando o Hélcio, velho parceiro, cantor e tecladista, no ChoppGol, na r. Felipe Camarão, em Vila Isabel (perto do Planeta Chopp), a partir das oito da noite. Aos que conhecem minhas tendências roqueiras, aviso logo: o trabalho nada tem a ver com elas. É todo calcado em cima de MPB e bem leve, no esquema da noite mesmo. Hélcio toca de tudo, de baladas a sambas, e eu o sigo na guitarra (canto algumas músicas eventualmente e faço uns backing vocals em outras). Se tudo der certo, passarei a acompanhá-lo todas as quartas-feiras.
23.7.02
Este vosso escriba foi ontem dar uma palestra interna aqui no jornal sobre blogs. Foi uma apresentação informal, tentei ser o mais claro possível. Embora em público eu prefira tocar guitarra (até porque falo muito rápido e isso às vezes pode atrapalhar), acho que consegui passar a idéia. Foi divertido, embora eu percebesse que minhas mãos tremiam de vez em quando ;-))
22.7.02
Publiquei este texto no SpamZine há algumas semanas. Já é hora de ele vir para o Cadafalso ;-)
A estante do tio Zé
Minha avó paterna morava no velho casarão da família, na rua Florianópolis, em Jacarepaguá. Hoje ele não existe mais. Mas nos anos 60 era um paraíso envelhecido repleto de mangueiras, tamarineiras e outras árvores frutíferas. Eu curtia a quietude e o cheiro de passado do lugar, e era gostoso brincar em seu enorme quintal. Mas meus primos eram muito mais velhos que eu, e logo se cansavam de minhas brincadeiras bobas. Acabava passando boa parte do tempo sozinho. Não demorou muito, desisti do quintal e me rendi às tintas e lápis de cor do tio Zé, o único artista da família -- era (ainda é) pintor. Ficava horas desenhando em sua escrivaninha, em seu quarto. Foi no mesmo cômodo que me lembro de ter sido enfeitiçado para sempre pelos livros. Na estante do tio Zé, havia coleções sobre o século XX, a Segunda Guerra e muitos volumes sobre os gênios da pintura. Foram alguns dos primeiros livros que folheei, fascinado. Descobri ali alguns dos personagens célebres da história do Brasil, os afundamentos trágicos de navios como o Titanic e o Bismarck, e o traço hipnótico de van Gogh. Tempos depois, minha madrinha me presentearia com uma coleção completa de Monteiro Lobato e eu nunca mais largaria os livros. Mas aquela estante foi a primeira, e a primeira, vocês sabem... não dá para esquecer.
Muito provavelmente, o tio Zé não sabe, mas tenho certeza de que seus livros e seu exemplo de humanista me tornaram o jornalista e blogwriter que sou hoje. Só posso agradecer (e muito) por ter escapado de uma vida convencional. Valeu, tio! Um brinde aos livros, que são os verdadeiros jardins cujos caminhos se bifurcam (licença, Borges) para todo o sempre.
A estante do tio Zé
Minha avó paterna morava no velho casarão da família, na rua Florianópolis, em Jacarepaguá. Hoje ele não existe mais. Mas nos anos 60 era um paraíso envelhecido repleto de mangueiras, tamarineiras e outras árvores frutíferas. Eu curtia a quietude e o cheiro de passado do lugar, e era gostoso brincar em seu enorme quintal. Mas meus primos eram muito mais velhos que eu, e logo se cansavam de minhas brincadeiras bobas. Acabava passando boa parte do tempo sozinho. Não demorou muito, desisti do quintal e me rendi às tintas e lápis de cor do tio Zé, o único artista da família -- era (ainda é) pintor. Ficava horas desenhando em sua escrivaninha, em seu quarto. Foi no mesmo cômodo que me lembro de ter sido enfeitiçado para sempre pelos livros. Na estante do tio Zé, havia coleções sobre o século XX, a Segunda Guerra e muitos volumes sobre os gênios da pintura. Foram alguns dos primeiros livros que folheei, fascinado. Descobri ali alguns dos personagens célebres da história do Brasil, os afundamentos trágicos de navios como o Titanic e o Bismarck, e o traço hipnótico de van Gogh. Tempos depois, minha madrinha me presentearia com uma coleção completa de Monteiro Lobato e eu nunca mais largaria os livros. Mas aquela estante foi a primeira, e a primeira, vocês sabem... não dá para esquecer.
Muito provavelmente, o tio Zé não sabe, mas tenho certeza de que seus livros e seu exemplo de humanista me tornaram o jornalista e blogwriter que sou hoje. Só posso agradecer (e muito) por ter escapado de uma vida convencional. Valeu, tio! Um brinde aos livros, que são os verdadeiros jardins cujos caminhos se bifurcam (licença, Borges) para todo o sempre.
19.7.02
18.7.02
É chegada a hora
Ah, como desejo beijar tua boca no escuro
e grudar-me nela como gruda na pele do leão
o sangue de velhos combates cicatrizados;
e ali sentir o frescor de tua essência arfante
como a brisa tênue na tarde da savana.
Tua boca há de ser um dia meu consolo
e sutura para uma face varrida pelos desígnios dos deuses;
deixar-te-ei as marcas de um homem devastado
mas também a chave para o cofre maltratado da paixão.
Beijarei-a como Salomé beijou a boca de Iokanaan,
no afã de ouvir seu último suspiro;
serei misericordioso, porém, e viverás para contar
que um dia um poeta te beijou no escuro, e tua vida mudou
e o ar se coloriu de âmbar
e da banheira se espargiu absinto
e o dia espreguiçou-se e permitiu à lua nova reinar mais tempo.
Ah, como desejo beijar tua boca no escuro
e grudar-me nela como gruda na pele do leão
o sangue de velhos combates cicatrizados;
e ali sentir o frescor de tua essência arfante
como a brisa tênue na tarde da savana.
Tua boca há de ser um dia meu consolo
e sutura para uma face varrida pelos desígnios dos deuses;
deixar-te-ei as marcas de um homem devastado
mas também a chave para o cofre maltratado da paixão.
Beijarei-a como Salomé beijou a boca de Iokanaan,
no afã de ouvir seu último suspiro;
serei misericordioso, porém, e viverás para contar
que um dia um poeta te beijou no escuro, e tua vida mudou
e o ar se coloriu de âmbar
e da banheira se espargiu absinto
e o dia espreguiçou-se e permitiu à lua nova reinar mais tempo.
17.7.02
Excelente o Márcio Moreira Alves, hoje no Globo:
""Quando a casa do vizinho está ardendo, ninguém pede que ele pague a mangueira do bombeiro antes de começar a combater o fogo”, disse Franklin Roosevelt no discurso de abril de 1941 no qual anunciou o programa “Lend and Lease”, que abria à Inglaterra, cercada pelos submarinos nazistas, crédito ilimitado para comprar nos Estados Unidos os materiais de guerra de que precisava.
Churchill, na sua primeira viagem aos Estados Unidos, havia pedido a medida, dizendo: “Não precisamos dos galantes exércitos que se formam nos Estados Unidos. Dêem-nos as ferramentas e nós terminaremos a tarefa”. Era mais do que uma bravata. As reservas inglesas já estavam totalmente esgotadas. O historiador Waren F. Kimball, que escreveu um livro sobre o programa, estendido à União Soviética em 1942, chamou-o de “The most unsordid act”, a mais generosa das leis.
A América Latina está precisando que os Estados Unidos aprovem leis tão generosas como a “Lend and Lease”. O mundo precisaria também de um estadista com a visão abrangente de Franklin Roosevelt. Em vez disso, temos um Congresso mesquinho, que coloca tantas exigências discriminatórias no fast track, autorização para o presidente concluir negociações bilaterais que a torna impraticável, e um presidente perigosamente medíocre e desinformado, que se recusa a autorizar seu Departamento do Tesouro e o FMI a salvar do caos os vizinhos do Sul. É verdade que o FMI e os bancos multilaterais talvez não tenham recursos suficientes para cumprir o papel salvador que deles se espera. É o que diz, em recente artigo, o economista francês Pierre Salema. Mas só se saberá se tentarem cumpri-lo." (...)
""Quando a casa do vizinho está ardendo, ninguém pede que ele pague a mangueira do bombeiro antes de começar a combater o fogo”, disse Franklin Roosevelt no discurso de abril de 1941 no qual anunciou o programa “Lend and Lease”, que abria à Inglaterra, cercada pelos submarinos nazistas, crédito ilimitado para comprar nos Estados Unidos os materiais de guerra de que precisava.
Churchill, na sua primeira viagem aos Estados Unidos, havia pedido a medida, dizendo: “Não precisamos dos galantes exércitos que se formam nos Estados Unidos. Dêem-nos as ferramentas e nós terminaremos a tarefa”. Era mais do que uma bravata. As reservas inglesas já estavam totalmente esgotadas. O historiador Waren F. Kimball, que escreveu um livro sobre o programa, estendido à União Soviética em 1942, chamou-o de “The most unsordid act”, a mais generosa das leis.
A América Latina está precisando que os Estados Unidos aprovem leis tão generosas como a “Lend and Lease”. O mundo precisaria também de um estadista com a visão abrangente de Franklin Roosevelt. Em vez disso, temos um Congresso mesquinho, que coloca tantas exigências discriminatórias no fast track, autorização para o presidente concluir negociações bilaterais que a torna impraticável, e um presidente perigosamente medíocre e desinformado, que se recusa a autorizar seu Departamento do Tesouro e o FMI a salvar do caos os vizinhos do Sul. É verdade que o FMI e os bancos multilaterais talvez não tenham recursos suficientes para cumprir o papel salvador que deles se espera. É o que diz, em recente artigo, o economista francês Pierre Salema. Mas só se saberá se tentarem cumpri-lo." (...)
16.7.02
Sem alma
Não posso sustentar o teu olhar sôfrego
porque hoje acordei sem alma.
Hoje sou apenas corpo e apetites
e nada sei do que te afliges.
Não posso responder ao que perguntas
porque estou despido de sentido.
Sou apenas um corpo celeste que obedece
e prossegue em sua trajetória irretocável
pelo silencioso Abismo.
Dirás, "mas estás triste!"
E nem mesmo poderei retrucar que não estou.
A melancolia não existe no Vácuo
Nem a alegria etílica das happy hours na adorável Lapa.
Só o que existe é ser, sem se saber, sem se perceber,
e voar nos seios frios (frios?) da eternidade.
Não posso sustentar o teu olhar sôfrego
porque hoje acordei sem alma.
Hoje sou apenas corpo e apetites
e nada sei do que te afliges.
Não posso responder ao que perguntas
porque estou despido de sentido.
Sou apenas um corpo celeste que obedece
e prossegue em sua trajetória irretocável
pelo silencioso Abismo.
Dirás, "mas estás triste!"
E nem mesmo poderei retrucar que não estou.
A melancolia não existe no Vácuo
Nem a alegria etílica das happy hours na adorável Lapa.
Só o que existe é ser, sem se saber, sem se perceber,
e voar nos seios frios (frios?) da eternidade.
15.7.02
12.7.02
11.7.02
Trechos de duas cartas das profundezas do Hades
I -- Um discípulo de Fausto conversa com sua alma corrompida
"Às vezes, seu velho ego
Volta para me assombrar
Diz coisas horríveis, me beija com lábios frios
Me embriaga de ódio, de tédio,
E depois volta para a sepultura de carne que habita.
Você é apenas um fantasma do que foi, ó minha alma
E eu a amo assim, apática, entrevada, morta em vida
Como a moldei, embevecido, com a matéria da minha vontade.
Mas seu velho ego é teimoso, volta sempre...
A noite parece estimulá-lo, como as marés,
E então sou eu que me escondo, viro tatu-bola,
Até a alvorada, que seduzi em segredo há tempos, voltar."
II -- De: Edgar Allan Poe. Para: Ligéia. Cc: Berenice
"Negra é a tinta com que me exponho
Negra é tua alma desalinhada
E tuas lágrimas que bruxuleiam
Pelas fissuras do horror em tua boca podre.
Treva! É em teu âmago
Que te toco, enojado
E deliciado
Como num século de sol morno
Como num dia de nuvens-magma
Como antes de olhar no espelho de Narciso.
Teus dentes
São como presas de vermes gigantes
Numa intempérie no deserto
Prontos para cravar-se em meus dendritos
Toda vez que tu sorris.
Esposa querida, prima desejada
Lapido meus textos
E assim te corto as palavras
Mato-te de êxtase metálico
Para que eu possa morrer aos poucos."
I -- Um discípulo de Fausto conversa com sua alma corrompida
"Às vezes, seu velho ego
Volta para me assombrar
Diz coisas horríveis, me beija com lábios frios
Me embriaga de ódio, de tédio,
E depois volta para a sepultura de carne que habita.
Você é apenas um fantasma do que foi, ó minha alma
E eu a amo assim, apática, entrevada, morta em vida
Como a moldei, embevecido, com a matéria da minha vontade.
Mas seu velho ego é teimoso, volta sempre...
A noite parece estimulá-lo, como as marés,
E então sou eu que me escondo, viro tatu-bola,
Até a alvorada, que seduzi em segredo há tempos, voltar."
II -- De: Edgar Allan Poe. Para: Ligéia. Cc: Berenice
"Negra é a tinta com que me exponho
Negra é tua alma desalinhada
E tuas lágrimas que bruxuleiam
Pelas fissuras do horror em tua boca podre.
Treva! É em teu âmago
Que te toco, enojado
E deliciado
Como num século de sol morno
Como num dia de nuvens-magma
Como antes de olhar no espelho de Narciso.
Teus dentes
São como presas de vermes gigantes
Numa intempérie no deserto
Prontos para cravar-se em meus dendritos
Toda vez que tu sorris.
Esposa querida, prima desejada
Lapido meus textos
E assim te corto as palavras
Mato-te de êxtase metálico
Para que eu possa morrer aos poucos."
9.7.02
Luís Fernando Veríssimo magistral, na veia, na mosca, hoje no Globo:
"Se entendi bem a lógica do momento, a situação do país é tão grave que seria temerário entregá-lo a qualquer outra facção que não a responsável pela situação ter ficado tão grave. Algo na linha do imperativo doméstico que a gente ouvia da mãe: quem sujou que limpe. Mas como os que sujaram não reconhecem que sujaram — pelo contrário, identificam-se como guardiões de uma normalidade ameaçada pela vitória da oposição — a analogia não vale.
Qual é exatamente o “caos” que viria com a eleição do Lula? Crise financeira, estagnação econômica, desemprego, um clima social explosivo? Isso tudo já tem. Essa é a normalidade ameaçada. Até o pior efeito previsto de uma mudança de modelo, a fuga do capital especulativo, já começou, e o que o espantou não foi a cara feia do Lula, mas o reconhecimento de que esse modelo não se sustenta. O pânico com a possibilidade de um calote não vem do medo da “esquerda”, que no poder não seria nem burra nem suicida, mas do tamanho da dívida, e o que tornou a dívida terrível foi a política de dependência total adotada pelo atual governo . Muito mais assustador — a longo prazo, até para os especuladores — do que a perspectiva de uma mudança deveria ser a perspectiva da continuação deste caminho sem alternativa para o desastre.
Mas tal é o domínio do pensamento econômico hegemônico sobre a nossa mente colonizada, que ele consegue até definir conceitos que a realidade em volta desmente, como os de “normalidade” e “caos”. Essa guerra civil permanente no meio da qual a gente vive não é o caos. Ou é um caos perfeitamente normal. A seriedade e a sensatez que uma aventura esquerdista supostamente destruiria são representadas pelos índices de desenvolvimento social que elas alcançaram.
Escolha qualquer um: saneamento básico, habitação, energia... Depois de oito anos de dependência total, ficamos dependentes até do vocabulário e dos valores do capital financeiro, como caddies miseráveis que adotam os hábitos dos ricos para os quais carregam o saco de golfe. A conveniência do mercado especulativo se tornou o nosso parâmetro de normalidade, e qualquer alternativa ao seu domínio, o nosso parâmetro de terror."
"Se entendi bem a lógica do momento, a situação do país é tão grave que seria temerário entregá-lo a qualquer outra facção que não a responsável pela situação ter ficado tão grave. Algo na linha do imperativo doméstico que a gente ouvia da mãe: quem sujou que limpe. Mas como os que sujaram não reconhecem que sujaram — pelo contrário, identificam-se como guardiões de uma normalidade ameaçada pela vitória da oposição — a analogia não vale.
Qual é exatamente o “caos” que viria com a eleição do Lula? Crise financeira, estagnação econômica, desemprego, um clima social explosivo? Isso tudo já tem. Essa é a normalidade ameaçada. Até o pior efeito previsto de uma mudança de modelo, a fuga do capital especulativo, já começou, e o que o espantou não foi a cara feia do Lula, mas o reconhecimento de que esse modelo não se sustenta. O pânico com a possibilidade de um calote não vem do medo da “esquerda”, que no poder não seria nem burra nem suicida, mas do tamanho da dívida, e o que tornou a dívida terrível foi a política de dependência total adotada pelo atual governo . Muito mais assustador — a longo prazo, até para os especuladores — do que a perspectiva de uma mudança deveria ser a perspectiva da continuação deste caminho sem alternativa para o desastre.
Mas tal é o domínio do pensamento econômico hegemônico sobre a nossa mente colonizada, que ele consegue até definir conceitos que a realidade em volta desmente, como os de “normalidade” e “caos”. Essa guerra civil permanente no meio da qual a gente vive não é o caos. Ou é um caos perfeitamente normal. A seriedade e a sensatez que uma aventura esquerdista supostamente destruiria são representadas pelos índices de desenvolvimento social que elas alcançaram.
Escolha qualquer um: saneamento básico, habitação, energia... Depois de oito anos de dependência total, ficamos dependentes até do vocabulário e dos valores do capital financeiro, como caddies miseráveis que adotam os hábitos dos ricos para os quais carregam o saco de golfe. A conveniência do mercado especulativo se tornou o nosso parâmetro de normalidade, e qualquer alternativa ao seu domínio, o nosso parâmetro de terror."
8.7.02
Fragmentos de um original roído pelas traças -- I
HENRIQUE
Mas então você não acha que ele escreve bem?
OTÁVIO
Ele escreve bem, mas não é um bom escritor.
MARCEL
Não vejo diferença...
OTÁVIO
Para escrever bem, você precisa saber todas as regras da gramática e todas as preciosidades do vocabulário. Para ser um bom escritor, você precisa de muito mais -- e sequer necessita da gramática. Um bom escritor mexe com idéias e não com palavras.
HENRIQUE
Idéias originais?
OTÁVIO
Às vezes. Sabem, no fundo, a originalidade não existe de fato. A alma humana é insondável demais para que alguém reivindique a invenção de qualquer coisa. Quem pode afirmar que a criação não esteve outrora nos subterrâneos das almas de outros homens?
MARCEL
Você quer dizer o inconsciente... Mas talvez a originalidade possa ser justamente a capacidade de extrair certa idéia do inconsciente e trazê-la à luz.
OTÁVIO, sorrindo.
Isso não é ser original. Isso é ser capaz de se comunicar e de teorizar, ou até de experimentar -- embora eu não leve em consideração esse tipo de experiência, já que faz sentido. A originalidade deixa de existir no momento em que passa a pertencer ao mundo das palavras. É por isso que digo que o bom escritor mexe com idéias. A "originalidade" desse bom escritor está justamente no que não foi escrito, entendeu? Ela pertence aos esgotos e às vísceras, que de certo modo são os esgotos do homem. Todos gostam de falar do cérebro humano; alguns defendem o coração; mas já descobri que as vísceras do homem guardam todo o seu potencial criativo. E só os escritores que remexem em suas vísceras conseguem alcançar a imortalidade. Há escritores cerebrais e escritores sentimentais -- e, hoje em dia, até escritores "capitais" --; mas estes nada valem se comparados aos mestres viscerais. É por isso que muitos artistas "originais" deixam obras que nos parecem "horríveis". Nem todas as tripas são revolvidas sem choques e angústias, e é por isso que o original traz sempre consigo alguma coisa de horripilante.
HENRIQUE
Mas então você não acha que ele escreve bem?
OTÁVIO
Ele escreve bem, mas não é um bom escritor.
MARCEL
Não vejo diferença...
OTÁVIO
Para escrever bem, você precisa saber todas as regras da gramática e todas as preciosidades do vocabulário. Para ser um bom escritor, você precisa de muito mais -- e sequer necessita da gramática. Um bom escritor mexe com idéias e não com palavras.
HENRIQUE
Idéias originais?
OTÁVIO
Às vezes. Sabem, no fundo, a originalidade não existe de fato. A alma humana é insondável demais para que alguém reivindique a invenção de qualquer coisa. Quem pode afirmar que a criação não esteve outrora nos subterrâneos das almas de outros homens?
MARCEL
Você quer dizer o inconsciente... Mas talvez a originalidade possa ser justamente a capacidade de extrair certa idéia do inconsciente e trazê-la à luz.
OTÁVIO, sorrindo.
Isso não é ser original. Isso é ser capaz de se comunicar e de teorizar, ou até de experimentar -- embora eu não leve em consideração esse tipo de experiência, já que faz sentido. A originalidade deixa de existir no momento em que passa a pertencer ao mundo das palavras. É por isso que digo que o bom escritor mexe com idéias. A "originalidade" desse bom escritor está justamente no que não foi escrito, entendeu? Ela pertence aos esgotos e às vísceras, que de certo modo são os esgotos do homem. Todos gostam de falar do cérebro humano; alguns defendem o coração; mas já descobri que as vísceras do homem guardam todo o seu potencial criativo. E só os escritores que remexem em suas vísceras conseguem alcançar a imortalidade. Há escritores cerebrais e escritores sentimentais -- e, hoje em dia, até escritores "capitais" --; mas estes nada valem se comparados aos mestres viscerais. É por isso que muitos artistas "originais" deixam obras que nos parecem "horríveis". Nem todas as tripas são revolvidas sem choques e angústias, e é por isso que o original traz sempre consigo alguma coisa de horripilante.
7.7.02
O encontro dos blogueiros ontem em Copa só teve quatro convivas (sábado é mais difícil mesmo juntar a galera), mas nem por isso foi menos divertido. O papo rolou solto entre este que vos escreve, a Suely (que estava muito bonita), o João M e o boa-praça Stanley, que descobri ser baixista e já convidei para um som qualquer dia desses. Falamos de tudo um pouco: eleições, copa, trabalho, curiosidades e, é claro, blogs ;-). Eu estava curiosíssimo para conhecer a MissDaisy, com quem vivo trocando comments, mas já sabia que ela não poderia ir. Vamos ver se na próxima dá. E também faltaram o Maggi, a Bani, a Tina, a Alessandra, a Elis (mas esta aqui está de férias, eu já desconfiava. E acabei de ver no blog dela que ficou doente, coitada!) e muitos outros. Da próxima vez, marcamos durante a semana.
Por outro lado, como disse a Su, a gente conversou mais e se conheceu um pouco melhor, o que nem sempre dá para fazer em encontros maiores, onde a dispersão aumenta.
Por outro lado, como disse a Su, a gente conversou mais e se conheceu um pouco melhor, o que nem sempre dá para fazer em encontros maiores, onde a dispersão aumenta.
6.7.02
Três excelentes artigos no Prosa e Verso de hoje. A capa, sobre Florbela Espanca, e as resenhas sobre Nietzsche e Einstein (esta escrita pelo gente finíssima Ronaldo Mourão, que encontrei boas vezes em meus tempos de Geográfica Universal).
5.7.02
Desvario
Jogos de palavras
Fluem ocos, sugando as pálpebras
Encharcadas de som, de sono,
Quero brilhar nas têmporas da savana negra
Mitos lúgubres, língua doida
De gravata fina sem nós mais
Terra em cortinas nubladas
Alumínio rangendo, lábios secos...
Oquei, vamos ao acaso, esquece tá?
E aí?
E aí?
Lágrimas descem mas viram vapor
Nocautes, ha ha.
Blague, desastre, que mais?
Responda, não ferre na mudez,
Vem algo d'água no cabelo,
Fim, eco e fim.
Jogos de palavras
Fluem ocos, sugando as pálpebras
Encharcadas de som, de sono,
Quero brilhar nas têmporas da savana negra
Mitos lúgubres, língua doida
De gravata fina sem nós mais
Terra em cortinas nubladas
Alumínio rangendo, lábios secos...
Oquei, vamos ao acaso, esquece tá?
E aí?
E aí?
Lágrimas descem mas viram vapor
Nocautes, ha ha.
Blague, desastre, que mais?
Responda, não ferre na mudez,
Vem algo d'água no cabelo,
Fim, eco e fim.
4.7.02
3.7.02
Retorno
Retorno a ti, poesia,
Para lamber minhas loucuras ao vento morno
Dos olhares da floresta e da penumbra
A sombra do passado atemoriza
E perderam-se as chaves da porta do futuro
Momentaneamente.
Fraqueza?
Talvez sono, quem sabe até fastio
Volto aos infernos do ópio
Absinto a dor e o zumbido nas pupilas!
Quebro-te, espelho,
Defronto-me melhor com o infinito
Tocando-me como um instrumento
e vomitando injúrias.
Caco de vidro inútil, estilhaças
Minha angústia podre de crostas nevoentas
E elevas meu horror ao expoente
Do perder-se de vista.
Retorno a ti, poesia,
Para lamber minhas loucuras ao vento morno
Dos olhares da floresta e da penumbra
A sombra do passado atemoriza
E perderam-se as chaves da porta do futuro
Momentaneamente.
Fraqueza?
Talvez sono, quem sabe até fastio
Volto aos infernos do ópio
Absinto a dor e o zumbido nas pupilas!
Quebro-te, espelho,
Defronto-me melhor com o infinito
Tocando-me como um instrumento
e vomitando injúrias.
Caco de vidro inútil, estilhaças
Minha angústia podre de crostas nevoentas
E elevas meu horror ao expoente
Do perder-se de vista.
1.7.02
Os Pentatemplários
(extraído de um manuscrito encontrado em 3002 pelo arqueólogo alemão Otto Kahn, descendente de Oliver Kahn, o Grande, nas ruínas de um antigo coliseu na Baviera)
"... A decadência do império teutão de Kahn, o Grande, deu-se a partir de 2002 d.C., quando o exército por ele liderado iniciou a jornada, após duras batalhas, para Korepan, a fabulosa Terra do Alvorecer, no distante Oriente. Os soldados de Kahn, disciplinados ao extremo, eram duros na queda e já haviam vencido três guerras sangrentas: uma na Suíça, outra na Alemanha e a terceira na Itália. Entretanto, haviam perdido valorosos soldados nos embates, e só os duros métodos de Kahn mantinham os resultados nos campos de batalha. Em sua jornada, os corajosos cavaleiros teutônicos começaram a ouvir falar de uma estranha lenda à medida que passavam de cidade em cidade. Primeiro, Kahn foi abordado pelo califa turco Hassan Sas, que segredou-lhe, em sua tenda, que o maior perigo que encontrariam em Korepan seriam os Pentatemplários, cavaleiros pertencentes a uma ordem de guerreiros ascetas capitaneados por Kafoo, o Terrível. Eles eram originários das Terras do Oeste, em cuja região sul haviam sido treinados pelo monge escoláristico Pheli Ponn. Diziam que os cavaleiros lutavam como nunca se havia visto antes, passando as armas entre si e confundindo os adversários com uma elasticidade incrível alcançada através de técnicas de concentração desconhecidas.
Kahn, porém, não se abalou. Dias depois, deparou-se com o exército chinês em debandada, com os uniformes rasgados, gritando que os Pentatemplários haviam matado quatro de seus mais competentes generais. A expressão apalermada dos chineses levou os teutões ao riso, bem como os guerreiros ciganos da Costa Opulenta do Atlântico, que encontraram bêbedos e cabisbaixos num desfiladeiro. A eles juntavam-se os arqueiros de Belgium, a que Kahn não deu atenção. Foi só quando viram, já perto da fortaleza de Yokohama, as hostes bretãs chacinadas sem piedade, com o símbolo pentatemplário escrito com sangue sobre seus uniformes, que os soldados teutônicos vacilaram. Na subida para a colina onde jazia a fortaleza, Kahn teve um encontro inesperado com mais um califa turco, Al Basturk. Este implorou para que não desse combate aos cavaleiros do Oeste.
Mas Kahn tinha uma reputação a preservar -- e foi essa a sua desgraça. A primeira parte da batalha de Yokohama foi dura, com os teutões e os pentatemplários praticamente se equivalendo em bravura. Mas na segunda o brilho foi da divisão comandada pelo coronel Roh Naldym, que fez uma carga diretamente sobre a tenda de Kahn. Ele resistiu na primeira investida, mas deixou o flanco descoberto e foi ferido. O coronel, percebendo sua hesitação, não o deixou respirar e, com a ajuda de uma manobra diversiva do coronel Ryv Aldow, levou Kahn a acreditar num ataque deste. Roh Naldym então deu o sinal para o golpe de misericórdia, deixando um perplexo Kahn a seus pés. A batalha não durou muito depois disso."
(extraído de um manuscrito encontrado em 3002 pelo arqueólogo alemão Otto Kahn, descendente de Oliver Kahn, o Grande, nas ruínas de um antigo coliseu na Baviera)
"... A decadência do império teutão de Kahn, o Grande, deu-se a partir de 2002 d.C., quando o exército por ele liderado iniciou a jornada, após duras batalhas, para Korepan, a fabulosa Terra do Alvorecer, no distante Oriente. Os soldados de Kahn, disciplinados ao extremo, eram duros na queda e já haviam vencido três guerras sangrentas: uma na Suíça, outra na Alemanha e a terceira na Itália. Entretanto, haviam perdido valorosos soldados nos embates, e só os duros métodos de Kahn mantinham os resultados nos campos de batalha. Em sua jornada, os corajosos cavaleiros teutônicos começaram a ouvir falar de uma estranha lenda à medida que passavam de cidade em cidade. Primeiro, Kahn foi abordado pelo califa turco Hassan Sas, que segredou-lhe, em sua tenda, que o maior perigo que encontrariam em Korepan seriam os Pentatemplários, cavaleiros pertencentes a uma ordem de guerreiros ascetas capitaneados por Kafoo, o Terrível. Eles eram originários das Terras do Oeste, em cuja região sul haviam sido treinados pelo monge escoláristico Pheli Ponn. Diziam que os cavaleiros lutavam como nunca se havia visto antes, passando as armas entre si e confundindo os adversários com uma elasticidade incrível alcançada através de técnicas de concentração desconhecidas.
Kahn, porém, não se abalou. Dias depois, deparou-se com o exército chinês em debandada, com os uniformes rasgados, gritando que os Pentatemplários haviam matado quatro de seus mais competentes generais. A expressão apalermada dos chineses levou os teutões ao riso, bem como os guerreiros ciganos da Costa Opulenta do Atlântico, que encontraram bêbedos e cabisbaixos num desfiladeiro. A eles juntavam-se os arqueiros de Belgium, a que Kahn não deu atenção. Foi só quando viram, já perto da fortaleza de Yokohama, as hostes bretãs chacinadas sem piedade, com o símbolo pentatemplário escrito com sangue sobre seus uniformes, que os soldados teutônicos vacilaram. Na subida para a colina onde jazia a fortaleza, Kahn teve um encontro inesperado com mais um califa turco, Al Basturk. Este implorou para que não desse combate aos cavaleiros do Oeste.
Mas Kahn tinha uma reputação a preservar -- e foi essa a sua desgraça. A primeira parte da batalha de Yokohama foi dura, com os teutões e os pentatemplários praticamente se equivalendo em bravura. Mas na segunda o brilho foi da divisão comandada pelo coronel Roh Naldym, que fez uma carga diretamente sobre a tenda de Kahn. Ele resistiu na primeira investida, mas deixou o flanco descoberto e foi ferido. O coronel, percebendo sua hesitação, não o deixou respirar e, com a ajuda de uma manobra diversiva do coronel Ryv Aldow, levou Kahn a acreditar num ataque deste. Roh Naldym então deu o sinal para o golpe de misericórdia, deixando um perplexo Kahn a seus pés. A batalha não durou muito depois disso."