O horror
1/4 de século depois
Da tempestade em sua virilha
O funcionário-modelo deslizou pelo hall da repartição
E mansamente entrou
-- Tremendo como naquela noite --
No terrível, austero aposento de tortura.
As mesas estavam onde sempre estiveram
A olhá-lo, convidativas e traiçoeiras
As máquinas de torcer miolos
Lá sussurravam, com suas teclas e seu papel timbrado
E as cadeiras, tão confortáveis! -- e no entanto
Capazes de espremer ideais, anseios tolos --
Também choraram de alegria ao vê-lo.
Mas ele, embora abalado, não lhes lançou
O mínimo olhar de soslaio que fosse,
E em seus passos de chumbo caminhou
Para o local secreto.
Parecia uma mesa como as outras
Estava, contudo, com a madeira podre e carcomida
A cadeira, paralítica,
Rasgara seu próprio espaldar de frustração
E a máquina, desdentada, gritava
E no seu estertor cuspia ferrugem.
Ele sorriu. Ali, o germe do sangue fervente
E da contradição fizera
A tortura funcionar às avessas.
Então, chorou, e as lágrimas
Caíam de seus olhos
Como bebês natimortos puxados a fórceps
(fazia um quarto de século que não chorava).
Porque ele sabia o que fizera a mesa fenecer
Abriu a gaveta e lá estava,
Coberto de arabescos criados por aranhas fantasmas,
Lá estava o poema
Que escrevera para ela
E jamais encontrado -- nunca lido
Nem ao menos rasgado num acesso de fúria.
Ele ergueu o papel
E o poema se despedaçou
E então tudo foi rápido demais
Mesmo para olhos treinados:
A mesa ficou lustrosa
A cadeira agora era giratória e reclinável
A máquina tinha tela de cristal líquido.
Os dentes-teclas desta última se arreganharam;
Ágeis, as pernas da cadeira lhe deram uma rasteira
E ele foi tragado pelo poço fumegante
que de repente se abrira no tampo da mesa.
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