14.2.03

Carta aberta a meus credores
(com exceção de M. N., o único agiota de coração mole do cosmo)

Ó corvos de plantão!
Ó gralhas sem cor nas cornijas da infâmia!
Ó sorrisos invisíveis de hienas!
Ó cupins e traças e vermes e todas as criaturas rastejantes!
Dizei!
Dizei de uma vez por todas se desejais meu sangue,
que hemácias, leucócitos e plaquetas, tenho-os à farta.

Oh! com mil diabos! O ouro não me aprecia, podeis entender?
Óbolos e dobrões escorregam de minhas palmas
como a amante interesseira da cama no primeiro dia de penúria.

Tomai meu sangue, bebei-o, fazei com ele farofinhas suculentas
e deixai-me esperar por Ela sossegado.
Ah! em algum desses paraísos diáfanos
inventados pelos homens medrosos
o ouro deve valer o mesmo que o caráter de Judas
e ser chutado sem piedade como os reles seixos do caminho.
Maldito ouro!
Maldita mais-valia!
Antes nascer esponja e filtrar a podridão dos oceanos
a visitar-vos com sorrisos falsos e mentiras sérias
e espargir um milhão de explicações perfumadas de insolvência.

Ó abjetos cobradores de call-centers!
Ó amaldiçoados oficiais de justiça!
Ó abutres pestilentos do fisco de todos os séculos!
Só me resta orar para que aqueles que vieram de mim
Jamais tenham de viver, como eu, entre vós.

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