Este artigo que saiu no Globo de ontem, no finzinho da página de opinião, pode ter passado despercebido. É longo, mas recomendo a leitura. Mostra como algumas coisas funcionam neste mundo esquecido por Deus.
"Washington não quer a Usina de Resende
OTHON L. P. DA SILVA
A produção de combustível é a etapa mais importante no domínio da tecnologia nuclear. Para obtê-lo, as usinas de enriquecimento de urânio utilizam a técnica da difusão gasosa ou da ultracentrifugação. Ao negociar o acordo com a Alemanha, nos anos 70, o Brasil tentou garantir a transferência da tecnologia de ultracentrifugação. Não conseguiu, porque os Estados Unidos vetaram.
O Brasil, então, aceitou a alternativa da tecnologia jet-nozzle, que até à compra não havia enriquecido um único grama de urânio. Em 1978, diante do fracasso consumado do jet-nozzle, o signatário deste artigo propôs e o Ministério da Marinha aceitou desenvolver ultracentrífugas para enriquecer o urânio disponível no país.
Fizemos a primeira operação quatro anos mais tarde, com ultracentrífuga integralmente idealizada, projetada e construída no Brasil. Em 1991, entrou em operação um módulo de cerca de 500 ultracentrífugas, com capacidade para produzir 280 quilos/ano de urânio com enriquecimento inferior de 5%. Esse teor é superior ao necessário para o combustível da usinas nucleares de Angra dos Reis e atende às necessidades de um reator naval, em desenvolvimento. Um núcleo deste reator utiliza cerca de seis toneladas de urânio a 5% e permite ao submarino operar por dez anos. A propulsão nuclear, observe-se, não é uma aplicação bélica, segundo a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão da ONU.
No governo Sarney, nos anos 80, quando construiu o primeiro módulo da Usina Experimental em Aramar, São Paulo, o país uniu-se à Argentina e criou uma agência binacional para fazer inspeções nos padrões da AIEA. Pouco depois, no governo Collor, incluiu-se a AIEA no acordo, permitindo-lhe o controle direto do urânio enriquecido produzido - salvaguardados segredos comerciais e tecnológicos. Até então, as 500 ultracentrífugas disponíveis ficavam absolutamente visíveis no módulo de Aramar. Para permitir o controle sem escancarar a tecnologia, adotamos solução parecida com a do mictório público francês: em fileiras duplas, as centrífugas passaram a funcionar entre dois biombos colocados cerca de 30 centímetros acima do solo. Permitia-se a visão dos pés (suas bases), sem exibir o corpo, possibilitando a monitoração das tubulações de entrada e saída de hexafluoreto de urânio.
A solução foi aprovada pela AIEA. Ela instalou câmeras cinematográficas seladas para garantir vigilância 24 horas por dia, com direito a uma cota anual de inspeções programadas - e de surpresa - em todas as instalações nucleares brasileiras.
Já o governo Fernando Henrique, contrariando décadas de coerência em política externa, aceitou ratificar o Tratado de Não Proliferação nuclear. O TNP é assimétrico e discriminatório por dispensar a inspeção em países nuclearmente armados e limitar a inspeção aos desarmados.
O governo americano, a pretexto de evitar a proliferação, agora nos pressiona a aderir ao protocolo adicional aos acordos de salvaguardas. Ele amplia as assimetrias do TNP, ao exigir tantas inspeções quanto forem arbitradas. Não apenas nas instalações nucleares mas em qualquer parte do território considerada suspeita - o que inclui nossas residências, se assim decidirem.
É fácil entender por que os EUA procuram impedir o avanço da Usina de Enriquecimento que a Indústrias Nucleares Brasileiras (INB) está construindo em Resende (RJ), com tecnologia cedida pela Marinha e sob supervisão da AIEA. Há uma razão econômica e outra estratégico-militar.
A econômica: como dispõe de grandes reservas de urânio e tecnologia própria - comercialmente competitiva - para produção do combustível, o país deixaria de ser exportador de minério e passaria à condição de importante global player no bilionário mercado de combustível nuclear.
Mas há, também, um motivo estratégico-militar. Os artefatos bélicos nucleares podem ser classificados de duas formas: os de destruição em massa e os inibidores de concentração de forças. Armas de destruição em massa são as de fusão (bombas de hidrogênio) e as de fissão de maior porte. As de baixa potência são inibidoras.
Qualquer operação militar para invasão ou ocupação de um território implica prévia concentração de forças. A existência de artefatos nucleares de baixa potência no território-alvo, com um vetor adequado de lançamento, funciona como poderoso inibidor.
Obviamente, não são do agrado de países que têm como opção política permanente a intervenção militar - independentemente da aprovação da ONU. A existência de uma usina de enriquecimento de urânio diminui o tempo entre a denúncia de todos os acordos e tratados já celebrados, e a eventual fabricação de artefatos (making nuclear weapon on short notice, no jargão internacional). É o que explica a ação americana - embora o Brasil tenha sempre deixado clara sua opção de não construir armas nucleares, chegando a incluir tal decisão na Constituição.
Sempre tivemos um comportamento exemplar em relação à não transferência de tecnologia sensível - diferentemente do Paquistão, que obteve a sua capacidade de enriquecer urânio através de um engenhoso programa de espionagem comandado pelo cientista Abdul Qadeer Khan e vendeu esta tecnologia a outros países. Sem as motivações bélicas daquele país, optamos por um sério programa de pesquisa e desenvolvimento que nos levou a melhores resultados técnicos e econômicos, a custos muito inferiores. E não vendemos a tecnologia desenvolvida.
As normas de inspeção da AIEA, às quais o Brasil atualmente está sujeito, são comprovadamente eficientes. São as mesmas utilizadas no pós-guerra por dezenas de anos, em relação aos regimes democráticos do Japão e da Alemanha, países que mantiveram renúncia à construção de artefatos mesmo nos momentos de crise na guerra fria. Não há razão para aceitarmos o endurecimento de normas, a pretexto das atitudes de outros países sujeitos a regimes não democráticos e com passado recente de confrontação com os EUA.
A proposta do presidente Bush de reiniciar testes nucleares e desenvolver uma nova geração de pequenos artefatos para serem usados de forma "cirúrgica", até mesmo contra países não nucleares, é preocupante para o mundo. Tais atitudes somadas a agressões, sem o respaldo do Conselho de Segurança da ONU, constituem forte estimulante à proliferação nuclear, principalmente nos países islâmicos com os quais tenham potencial de confrontação.
Desde a independência, o Brasil é um aliado dos Estados Unidos. O povo brasileiro aprecia vários aspectos da cultura americana, porém tem o direito de resistir às pressões e recusar o protocolo adicional aos acordos de salvaguardas, assim como serenamente, sem antagonismos, não aceitar vetos sobre atividades pacíficas com grande significado comercial.
O Brasil é aliado dos EUA, mas não pode aceitar veto sobre atividade pacífica e comercial."
OTHON L. P. DA SILVA é empresário, engenheiro naval, mecânico e nuclear e vice-almirante na reserva.
11.3.04
7.3.04
Enviado pelo C@t:
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"A fábula moderna"
por Max Gehringer
Revista Exame, nº 772
2002-08-07
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Foi tudo muito rápido. A executiva bem-sucedida sentiu uma pontada no peito, vacilou, cambaleou, deu um gemido e apagou. Quando voltou a abrir os olhos, viu-se diante de um imenso portal. Ainda meio zonza, atravessou-o e deu de cara com uma miríade de pessoas, todas vestindo cândidos camisolões e caminhando despreocupadas. Sem entender bem o que estava acontecendo, a executiva bem-sucedida abordou um dos passantes:
- Enfermeiro, eu preciso voltar urgente para o meu escritório porque tenho um meeting importantíssimo. Aliás, acho que fui trazida para cá por engano, porque meu convênio médico é classe A, e isto aqui está me parecendo mais um pronto-socorro. Onde é que nós estamos?
- No céu.
- No céu?...
- É. Tipo assim, o céu, aquele. Com querubins voando e coisas do gênero.
- Que é isso amigo, você está com gozação?
- Certamente. Aqui todos vivemos em estado de gozo permanente.
Apesar das óbvias evidências (nenhuma poluição, todo mundo sorrindo, ninguém usando telefone celular), a executiva bem-sucedida custou um pouco a admitir que havia mesmo apitado na curva. Tentou então o plano B: convencer o interlocutor, por meio das infalíveis técnicas avançadas de negociação, de que aquela situação era inaceitável.
Porque, ponderou. dali a uma semana ela iria receber o bônus anual, além de estar fortemente cotada para assumir a posição de presidente do conselho de administração da empresa. E foi aí que o interlocutor sugeriu:
- Talvez seja melhor você conversar com Pedro, o síndico.
- É? E como é que eu marco uma audiência? Ele tem secretária?
- Não, não. Basta estalar os dedos e ele aparece.
- Assim? (...)
- Pois não?
A executiva bem-sucedida quase desaba da nuvem. À sua frente, imponente, segurando uma chave que mais parecia um martelo, estava o próprio Pedro.
Mas a executiva havia feito um curso intensivo de approach para situações inesperadas e reagiu rapidinho:
- Bom dia. Muito prazer. Belas sandálias. Eu sou uma executiva bem-sucedida e...
- Executiva... Que palavra estranha. De que século você veio?
- Do 21. O distinto vai me dizer que não conhece o termo "executiva"?
- Já ouvi falar. Mas não é do meu tempo.
Foi então que a executiva bem-sucedida teve um insight. A máxima autoridade ali no paraíso aparentava ser um zero à esquerda em modernas técnicas de gestão empresarial. Logo, com seu brilhante currículo tecnocrático, a executiva poderia rapidamente assumir uma posição hierárquica, por assim dizer, celestial ali na organização.
- Sabe, meu caro Pedro, se você me permite, eu gostaria de lhe fazer uma proposta. Basta olhar para esse povo todo aí, só batendo papo e andando à toa, para perceber que aqui no Paraíso há enormes oportunidades para dar um upgrade na produtividade sistêmica.
- É mesmo?
- Pode acreditar, porque tenho PHD em reengenharia. Por exemplo, não vejo ninguém usando crachá. Como é que a gente sabe quem é quem aqui, e quem faz o quê?
- Ah, não sabemos.
- Headcount, então, não deve constar em nenhum versículo, correto?
- Hã?
- Entendeu o meu ponto? Sem controle, há dispersão. E dispersão gera desmotivação. Com o tempo, isto aqui vai acabar virando uma anarquia. Mas nós dois podemos consertar tudo isso rapidinho implementando um simples programa de targets individuais e avaliação de performance.
- Que interessante...
- Depois, mais no médio prazo, assim que os fundamentos estiverem sólidos e o pessoal começar a reclamar da pressão e a ficar estressado, a gente acalma a galera bolando um sistema de stock option, com uma campanha motivacional impactante, tipo: "O melhor céu da América Latina".
- Fantástico!
- É claro que, antes de tudo, precisaríamos de uma hierarquização de um organograma funcional, nada que dinâmicas de grupo e avaliações de perfis psicológicos não consigam resolver. Aí, contrataríamos uma consultoria especializada para nos ajudar a definir as estratégias operacionais e estabeleceríamos algumas metas factíveis de leverage, maximizando, dessa forma, o retorno do investimento do Grande Acionista... Ele existe, certo?
- Sobre todas as coisas.
- Ótimo. O passo seguinte seria partir para um downsizing progressivo, encontrar sinergias hi-tech, redigir manuais de procedimento, definir o marketing mix e investir no desenvolvimento de produtos alternativos de alto valor agregado. O mercado telestérico, por exemplo, me parece extremamente atrativo.
- Incrível!
- É obvio que, para conseguir tudo isso, nós dois teremos que nomear um board de altíssimo nível. Com um pacote de remuneração atraente, é claro. Coisa assim de salário de seis dígitos e todos os fringe benefits e mordomias de praxe. Porque, agora falando de colega para colega, tenho certeza de que você vai concordar comigo, Pedro. O desafio que temos pela frente vai resultar em um turnaround radical.
- Impressionante!
- Isso significa que podemos partir para a implementação?
- Não. Significa que você terá um futuro brilhante se for trabalhar com o nosso concorrente. Porque você acaba de descrever, exatamente, como funciona o Inferno...
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"A fábula moderna"
por Max Gehringer
Revista Exame, nº 772
2002-08-07
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Foi tudo muito rápido. A executiva bem-sucedida sentiu uma pontada no peito, vacilou, cambaleou, deu um gemido e apagou. Quando voltou a abrir os olhos, viu-se diante de um imenso portal. Ainda meio zonza, atravessou-o e deu de cara com uma miríade de pessoas, todas vestindo cândidos camisolões e caminhando despreocupadas. Sem entender bem o que estava acontecendo, a executiva bem-sucedida abordou um dos passantes:
- Enfermeiro, eu preciso voltar urgente para o meu escritório porque tenho um meeting importantíssimo. Aliás, acho que fui trazida para cá por engano, porque meu convênio médico é classe A, e isto aqui está me parecendo mais um pronto-socorro. Onde é que nós estamos?
- No céu.
- No céu?...
- É. Tipo assim, o céu, aquele. Com querubins voando e coisas do gênero.
- Que é isso amigo, você está com gozação?
- Certamente. Aqui todos vivemos em estado de gozo permanente.
Apesar das óbvias evidências (nenhuma poluição, todo mundo sorrindo, ninguém usando telefone celular), a executiva bem-sucedida custou um pouco a admitir que havia mesmo apitado na curva. Tentou então o plano B: convencer o interlocutor, por meio das infalíveis técnicas avançadas de negociação, de que aquela situação era inaceitável.
Porque, ponderou. dali a uma semana ela iria receber o bônus anual, além de estar fortemente cotada para assumir a posição de presidente do conselho de administração da empresa. E foi aí que o interlocutor sugeriu:
- Talvez seja melhor você conversar com Pedro, o síndico.
- É? E como é que eu marco uma audiência? Ele tem secretária?
- Não, não. Basta estalar os dedos e ele aparece.
- Assim? (...)
- Pois não?
A executiva bem-sucedida quase desaba da nuvem. À sua frente, imponente, segurando uma chave que mais parecia um martelo, estava o próprio Pedro.
Mas a executiva havia feito um curso intensivo de approach para situações inesperadas e reagiu rapidinho:
- Bom dia. Muito prazer. Belas sandálias. Eu sou uma executiva bem-sucedida e...
- Executiva... Que palavra estranha. De que século você veio?
- Do 21. O distinto vai me dizer que não conhece o termo "executiva"?
- Já ouvi falar. Mas não é do meu tempo.
Foi então que a executiva bem-sucedida teve um insight. A máxima autoridade ali no paraíso aparentava ser um zero à esquerda em modernas técnicas de gestão empresarial. Logo, com seu brilhante currículo tecnocrático, a executiva poderia rapidamente assumir uma posição hierárquica, por assim dizer, celestial ali na organização.
- Sabe, meu caro Pedro, se você me permite, eu gostaria de lhe fazer uma proposta. Basta olhar para esse povo todo aí, só batendo papo e andando à toa, para perceber que aqui no Paraíso há enormes oportunidades para dar um upgrade na produtividade sistêmica.
- É mesmo?
- Pode acreditar, porque tenho PHD em reengenharia. Por exemplo, não vejo ninguém usando crachá. Como é que a gente sabe quem é quem aqui, e quem faz o quê?
- Ah, não sabemos.
- Headcount, então, não deve constar em nenhum versículo, correto?
- Hã?
- Entendeu o meu ponto? Sem controle, há dispersão. E dispersão gera desmotivação. Com o tempo, isto aqui vai acabar virando uma anarquia. Mas nós dois podemos consertar tudo isso rapidinho implementando um simples programa de targets individuais e avaliação de performance.
- Que interessante...
- Depois, mais no médio prazo, assim que os fundamentos estiverem sólidos e o pessoal começar a reclamar da pressão e a ficar estressado, a gente acalma a galera bolando um sistema de stock option, com uma campanha motivacional impactante, tipo: "O melhor céu da América Latina".
- Fantástico!
- É claro que, antes de tudo, precisaríamos de uma hierarquização de um organograma funcional, nada que dinâmicas de grupo e avaliações de perfis psicológicos não consigam resolver. Aí, contrataríamos uma consultoria especializada para nos ajudar a definir as estratégias operacionais e estabeleceríamos algumas metas factíveis de leverage, maximizando, dessa forma, o retorno do investimento do Grande Acionista... Ele existe, certo?
- Sobre todas as coisas.
- Ótimo. O passo seguinte seria partir para um downsizing progressivo, encontrar sinergias hi-tech, redigir manuais de procedimento, definir o marketing mix e investir no desenvolvimento de produtos alternativos de alto valor agregado. O mercado telestérico, por exemplo, me parece extremamente atrativo.
- Incrível!
- É obvio que, para conseguir tudo isso, nós dois teremos que nomear um board de altíssimo nível. Com um pacote de remuneração atraente, é claro. Coisa assim de salário de seis dígitos e todos os fringe benefits e mordomias de praxe. Porque, agora falando de colega para colega, tenho certeza de que você vai concordar comigo, Pedro. O desafio que temos pela frente vai resultar em um turnaround radical.
- Impressionante!
- Isso significa que podemos partir para a implementação?
- Não. Significa que você terá um futuro brilhante se for trabalhar com o nosso concorrente. Porque você acaba de descrever, exatamente, como funciona o Inferno...
4.3.04
Já está na terceira fase a seqüência de publicação dos Minicontos deste guardião no site literário paralelos. A seqüência, editada por mestre Augusto Sales, vai do miniconto 21 ao 30. Aqui.
29.2.04
Todas as águas-vivas ao sabor das ondas
são atraídas por minha tristeza
e queimam como que para me purgar
do seu amor perdido
das palavras proibidas
que transformaram em vinagre
o outrora perfumado odor de suas mãos
nas minhas.
Hoje, toda vez que falo a uma linda jovem
vejo nos olhos curiosos as suas órbitas
nos cabelos viçosos e despojados os seus
na boca em flor seu jardim
que eu tanto queria irrigar
com minha alegria selvagem
minha verve
e alguma feitiçaria antiga.
Ah! mas só me restaram as vagas
e o escuro de velhos cinemas
onde um homem pode chorar só e digno
e esperar pela Hora.
são atraídas por minha tristeza
e queimam como que para me purgar
do seu amor perdido
das palavras proibidas
que transformaram em vinagre
o outrora perfumado odor de suas mãos
nas minhas.
Hoje, toda vez que falo a uma linda jovem
vejo nos olhos curiosos as suas órbitas
nos cabelos viçosos e despojados os seus
na boca em flor seu jardim
que eu tanto queria irrigar
com minha alegria selvagem
minha verve
e alguma feitiçaria antiga.
Ah! mas só me restaram as vagas
e o escuro de velhos cinemas
onde um homem pode chorar só e digno
e esperar pela Hora.
19.2.04
eu hoje não quero falar com o poema
quero esboeteá-lo
açoitá-lo
e deixá-lo sangrar ao relento
fitando de olhos turvos
a aurora boreal no inferno.
não
na verdade eu quero gritar com o poema
até ele se encolher num canto da estação
e depois flanar sobre os trilhos eletrificados
e desertar do exército de zumbis.
de verdade?
eu só quero fumar um hollywood
e investigar o oceano
em silêncio
e pensar em todos os erros
que cometi com você.
quero esboeteá-lo
açoitá-lo
e deixá-lo sangrar ao relento
fitando de olhos turvos
a aurora boreal no inferno.
não
na verdade eu quero gritar com o poema
até ele se encolher num canto da estação
e depois flanar sobre os trilhos eletrificados
e desertar do exército de zumbis.
de verdade?
eu só quero fumar um hollywood
e investigar o oceano
em silêncio
e pensar em todos os erros
que cometi com você.
13.2.04
Algumas manchetes recentes:
"Petrobras tem maior lucro da história"
"Ganho com tarifas aumenta lucro do Unibanco"
"Lucro da Caixa cresceu 50% ano passado"
"Lucro do Bradesco chegou a R$ 2,3 bi no ano passado"
"Citigroup lucra US$ 4,76 bi"
"Lucro da IBM é de US$ 2,7 bilhões"
"Lucro da Aracruz subiu 7.000% no ano passado"
E eu pergunto, como o Plebe Rude: cadê nossa fração?
"Petrobras tem maior lucro da história"
"Ganho com tarifas aumenta lucro do Unibanco"
"Lucro da Caixa cresceu 50% ano passado"
"Lucro do Bradesco chegou a R$ 2,3 bi no ano passado"
"Citigroup lucra US$ 4,76 bi"
"Lucro da IBM é de US$ 2,7 bilhões"
"Lucro da Aracruz subiu 7.000% no ano passado"
E eu pergunto, como o Plebe Rude: cadê nossa fração?
10.2.04
Soneto pela quietude
Vais a Zeus de salto alto
E esnobas Afrodite;
Quando beijas o asfalto
Só esperas tendinite?
Me atiras alfarrábios
mas só queres auto-ajuda
Tocas rindo outros lábios
Nunca sabes ficar muda.
Solidão, quero socorro
contra fogos d'artifício
Em tal festa só eu morro
Muito antes do solstício.
Devolvei o velho gorro
já cansei deste comício.
Vais a Zeus de salto alto
E esnobas Afrodite;
Quando beijas o asfalto
Só esperas tendinite?
Me atiras alfarrábios
mas só queres auto-ajuda
Tocas rindo outros lábios
Nunca sabes ficar muda.
Solidão, quero socorro
contra fogos d'artifício
Em tal festa só eu morro
Muito antes do solstício.
Devolvei o velho gorro
já cansei deste comício.
Soneto demente
Teu amor vem descartável
Como a pele da serpente
Faz a alma miserável
É poção adstringente
A paixão não te acomete
Só conheces "eu desejo"
Corações ao vinagrete,
Estratégia no solfejo...
E ainda do teu seio
Grito de abstinência
Toda vez que, só, releio
Minha carta de demência.
Uns fantasmas, esfaqueio
Outros são Vossa Excelência.
Teu amor vem descartável
Como a pele da serpente
Faz a alma miserável
É poção adstringente
A paixão não te acomete
Só conheces "eu desejo"
Corações ao vinagrete,
Estratégia no solfejo...
E ainda do teu seio
Grito de abstinência
Toda vez que, só, releio
Minha carta de demência.
Uns fantasmas, esfaqueio
Outros são Vossa Excelência.
6.2.04
2.2.04
Saí ontem do jornal às 23 e tanto. Por isso estou tão cansado. Segunda-feira depois de plantão é como a ressaca de uma bebida que você tomou porque não havia outra opção. O plantão só vale pelo ar-condicionado da redação...
Mal posso esperar pelo sábado que vem, o final dos 12 dias seguidos de labuta.
Mal posso esperar pelo sábado que vem, o final dos 12 dias seguidos de labuta.
31.1.04
Também vi no DVD "Tiros em Columbine", que não consegui ver ano passado. Realmente, é bom demais. O extra é uma entrevista coletiva de Michael Moore praticamente sem cortes (43 minutos), feita com jornalistas britânicos. A lucidez do homem é um bálsamo nesta era em que tantos em alguma posição de poder mentem descaradamente. A gente fica com uma vontade danada de beber várias cervejas com o cara num boteco, de tão legal que ele é. Oxalá um dia eu possa entrevistá-lo.

Taí, se dependesse de mim, eu daria o Oscar a "Mestre dos mares". O filme é puro cinemão, uma delícia. Russel Crowe está perfeito como o capitão do HMS Surprise, Jack Aubrey, e comanda um épico naval de primeira linha. A crítica é apenas à visão mostrada de um pedaço da costa brasileira em 1805, com índios e uns poucos portugueses (e uma bela cabrocha, diga-se de passagem). Estava mais para século XVI, acho... Mas não compromete a diversão do início ao fim. Inclusive, vale ir a um cinema bem equipado para ver. Assisti no São Luiz, no Catete, e a artilharia das batalhas entre os navios parecia estar acontecendo bem no meio do cinema.
Também gostei do personagem do médico-naturalista, interpretado por Paul Bettany.
29.1.04

Was this His coming! I had hoped to see
A scene of wondrous glory, as was told
Of some great God who in a rain of gold
Broke open bars and fell on Danae:
Or a dread vision as when Semele
Sickening for love and unappeased desire
Prayed to see God's clear body, and the fire
Caught her brown limbs and slew her utterly:
With such glad dreams I sought this holy place,
And now with wondering eyes and heart I stand
Before this supreme mystery of Love:
Some kneeling girl with passionless pale face,
An angel with a lily in his hand,
And over both the white wings of a Dove.
("Ave Maria Gratia Plena", de Oscar Wilde)
27.1.04
Fui ver "A importância de ser fiel", no Villa-Lobos. A peça, a mais divertida de Oscar Wilde, tem uma das mais gostosas aberturas com os amigos Algernon e Jack conversando na casa do primeiro. É um verdadeiro festival de frases espirituosas que fazem logo o público entrar no clima wildeano, leve e gozador (se não tivesse sido irlandês, aliás, o escritor teria dado um ótimo carioca). Dalton Vigh é o Algernon perfeito, um dândi que confere o devido charme ao "ato" de não fazer nada. E, naturalmente, Natália Timberg é uma Lady Bracknell irretocável.
Não gostei de Brian Penido, do grupo Tapa, como Jack, achei que ficou artificial demais. Mas, no todo, a montagem é gostosa e conferiu uma boa "despressurizada" a uma sexta-feira pós-fechamento.
Não gostei de Brian Penido, do grupo Tapa, como Jack, achei que ficou artificial demais. Mas, no todo, a montagem é gostosa e conferiu uma boa "despressurizada" a uma sexta-feira pós-fechamento.
23.1.04
19.1.04
O DVD de "Procurando Nemo" tem uns extras deliciosos. O melhor é um minidocumentário com Jean-Michel Costeau (o filho de Jacques) sobre corais e recifes. "Documentário" em termos, porque os peixinhos do desenho aparecem no meio da narrativa do pobre Jean-Michel e roubam a cena até o homem dar um ataque de pelanca. Eu e minhas filhas Jessica e Rebeca gargalhamos sem parar.
16.1.04
Soneto desmesurado da perda
Denunciou o descontrole na missiva
Tua letra apressada e tremida;
E com esferográfica borracha
Ali me apagaste de tua vida.
Foi tão absoluto meu espanto
que só sobraram palavras vazias;
com elas respondi como robô
ao disparate que dizias.
Depois chorei sozinho no escuro
e decidi nunca mais lhe falar
Só hoje amargo o gesto impuro
Pois que perdi a fé no amar
e já nenhum feitiço conjuro
Que fique Vênus no velho altar.
Denunciou o descontrole na missiva
Tua letra apressada e tremida;
E com esferográfica borracha
Ali me apagaste de tua vida.
Foi tão absoluto meu espanto
que só sobraram palavras vazias;
com elas respondi como robô
ao disparate que dizias.
Depois chorei sozinho no escuro
e decidi nunca mais lhe falar
Só hoje amargo o gesto impuro
Pois que perdi a fé no amar
e já nenhum feitiço conjuro
Que fique Vênus no velho altar.
14.1.04
Meus "Minicontos do Desconforto" já começaram a ser publicados no site Paralelos! Eles estão aqui, e também há aqui uma introdução sobre as séries do site por mestre Augusto Sales.
Os contos estão saindo em séries de dez, que serão publicadas em seis semanas. Grande Augusto, quero agradecer a gentileza.
Os contos estão saindo em séries de dez, que serão publicadas em seis semanas. Grande Augusto, quero agradecer a gentileza.
"O americano tranqüilo", baseado num livro de Graham Greene, é um excelente filme. Michael Caine está perfeito como um correspondente britânico em Saigon nos anos 50 que vive um triângulo amoroso-político com uma bela vietnamita e um americano interpretado por Brendan Fraser.
Uma história sobre desejos, traição, escolhas e os pecados que grudam em nossa alma, dos quais não podemos nos livrar.
Uma história sobre desejos, traição, escolhas e os pecados que grudam em nossa alma, dos quais não podemos nos livrar.
13.1.04
Um pulinho rápido à terra da garoa hoje. Fui e voltei, em vôos sossegados e observando o tapete de nuvens sobre Rio e Sampa. Depois de uma conferência com altos bytes de complexidade, supercomputação e arquiteturas cabeludas, foi bom olhar o céu e simplesmente refletir.
Mas é igualmente interessante estar em aviões menores, que ficam em altitudes mais baixas e permitem ver a terra (ou o mar) lá embaixo. Nesse sentido, um dos vôos mais fantásticos em que estive foi num jatinho da Embraer usado pela United entre Los Angeles e San Diego, na Califórnia. Acabara de chover e o dia estava ficando ensolarado, com nuvens esparsas. Eram mais ou menos três horas da tarde e o avião passeava entre as nuvens, voando baixo sobre a costa do Oceano Pacífico. Era como se eu estivesse no meio de esculturas gigantes de algodão-doce sobre o mar, torneadas pelo vento. A impressão que se tinha era que esbarraríamos em alguma divindade greco-romana esquecida naquele labirinto de nuvens.
Mas é igualmente interessante estar em aviões menores, que ficam em altitudes mais baixas e permitem ver a terra (ou o mar) lá embaixo. Nesse sentido, um dos vôos mais fantásticos em que estive foi num jatinho da Embraer usado pela United entre Los Angeles e San Diego, na Califórnia. Acabara de chover e o dia estava ficando ensolarado, com nuvens esparsas. Eram mais ou menos três horas da tarde e o avião passeava entre as nuvens, voando baixo sobre a costa do Oceano Pacífico. Era como se eu estivesse no meio de esculturas gigantes de algodão-doce sobre o mar, torneadas pelo vento. A impressão que se tinha era que esbarraríamos em alguma divindade greco-romana esquecida naquele labirinto de nuvens.
9.1.04
Tem dias que a gente fica tão irritado que precisa rememorar os versos imortais de Charles Chaplin:
Light up your face with gladness
Hide every trace of sadness
Although a tear may be
Ever so near
That's the time
You must keep on trying
Smile,
What's the use of crying
You'll find that life is still worth while
If you
Just smile
Light up your face with gladness
Hide every trace of sadness
Although a tear may be
Ever so near
That's the time
You must keep on trying
Smile,
What's the use of crying
You'll find that life is still worth while
If you
Just smile
7.1.04
6.1.04
A festa ontem foi muito engraçada. Miss Monteiro estava com a corda toda, e a animada mesa, num cantinho escondido da Princesinha do Mar, contou com coleguinhas de todos os cantos. Tia Cora foi e logo uma parte da trupe estava envolta num mar de gadgets. Enfim, fomos todos felizes, transformando a noite de segunda num verdadeiro pré-pré-pré-sábado.
5.1.04
4.1.04
Um quark
Na madrugada aquosa
sonhou com uma pitada de aventura
e mais do que nunca a desejou a seu lado
rindo na escada
e sussurrando
para que tocasse também o outro seio
sob a blusa desabotoada.
Despertou
com o som das goteiras na alma
e suspirou para a escuridão:
ela estava lá e não mais estava;
podia ouvir sua respiração suave
mas ela, a verdadeira,
havia ficado numa esquina do tempo.
Ah! e o pior, o pior
era que ele também parara em algum ponto
-- e a ponderação levara adiante outro pedaço de si.
Ó ímpetos perdidos nas estrelas!
Tenham piedade de nossos eus desbotados
e lancem-nos um quark irresponsável de vez em quando;
pois no que a vida descobre o palor de suas faces
é penoso ter caprichos sem alguma cumplicidade.
Na madrugada aquosa
sonhou com uma pitada de aventura
e mais do que nunca a desejou a seu lado
rindo na escada
e sussurrando
para que tocasse também o outro seio
sob a blusa desabotoada.
Despertou
com o som das goteiras na alma
e suspirou para a escuridão:
ela estava lá e não mais estava;
podia ouvir sua respiração suave
mas ela, a verdadeira,
havia ficado numa esquina do tempo.
Ah! e o pior, o pior
era que ele também parara em algum ponto
-- e a ponderação levara adiante outro pedaço de si.
Ó ímpetos perdidos nas estrelas!
Tenham piedade de nossos eus desbotados
e lancem-nos um quark irresponsável de vez em quando;
pois no que a vida descobre o palor de suas faces
é penoso ter caprichos sem alguma cumplicidade.
26.12.03
Como trabalhei na semana do Natal, vou parar uns dias para curtir o resquício de ano. Deixo para vocês um poema novinho, saido quentinho da forja.
E desejo a todos um 2004 em que a gente não seja tão refém das expectativas e possa viver mais feliz, um dia por vez.
Uma coisa é certa: eu estarei aqui, como sempre.
Abraços e saúde!
Animalesque
Deitou entre seus seios de neve
e escutou a carne bombeando dentro;
aproximou mais a orelha em chamas.
E por um instante sentiu
a delícia de ser completamente animal
todo instinto
todo tato e cheiros
todo corpo e sangue da Natureza.
Ela disse depois
que em seu sono ele rira
e ele lembrou-se por quê
mas não respondeu.
Guardou para si
a imagem onírica
do sexo perfeito:
dois corpos famintos em transe
e duas almas diáfanas
atiradas sobre os criados-mudos
sabendo a conhecimento e mofo.
E desejo a todos um 2004 em que a gente não seja tão refém das expectativas e possa viver mais feliz, um dia por vez.
Uma coisa é certa: eu estarei aqui, como sempre.
Abraços e saúde!
Animalesque
Deitou entre seus seios de neve
e escutou a carne bombeando dentro;
aproximou mais a orelha em chamas.
E por um instante sentiu
a delícia de ser completamente animal
todo instinto
todo tato e cheiros
todo corpo e sangue da Natureza.
Ela disse depois
que em seu sono ele rira
e ele lembrou-se por quê
mas não respondeu.
Guardou para si
a imagem onírica
do sexo perfeito:
dois corpos famintos em transe
e duas almas diáfanas
atiradas sobre os criados-mudos
sabendo a conhecimento e mofo.
23.12.03
Moçada, um feliz Natal a todos, com um fraterno abraço deste Guardião.
Descoberta
E de repente enxergo através de ti
E te descubro a mais paradoxal das damas
Imaginava-a forte, devastadora, impiedosa
E no entanto és tão frágil quanto eu
Folha de outono, que pode cair e renascer
Carregar e recarregar o ciclo
Fiquemos assim, unidos silentes
O mundo gira, passa
E nos vira de cabeça para baixo
Mas estamos ali.
Descoberta
E de repente enxergo através de ti
E te descubro a mais paradoxal das damas
Imaginava-a forte, devastadora, impiedosa
E no entanto és tão frágil quanto eu
Folha de outono, que pode cair e renascer
Carregar e recarregar o ciclo
Fiquemos assim, unidos silentes
O mundo gira, passa
E nos vira de cabeça para baixo
Mas estamos ali.
17.12.03
Chope, parte 2: ontem a boa mesa no Manuel e Joaquim da Lapa contou com minha querida Glorinha Dettmar, Ariadne, Mônica Arantes, Marcinha Miranda, Felipe Dias, Cristina Azevedo, o veterano Orlando Abrunhosa, Alexandre Mandarino e Leonardo Pimentel.
E hoje tem a festa do Info etc. Acho que vou ficar na água mineral ;-)
E hoje tem a festa do Info etc. Acho que vou ficar na água mineral ;-)
16.12.03
Chope animado ontem no Lamas com o Gustones, a Marcele, Maloca, Claudinha, Feroli, Júlio Preuss e Abel Alves. Hoje tem mais. Nada como rever a turma na volta ao trabalho.
15.12.03
Moçada, estou de volta. Descansei para valer, desta vez, e me desliguei do real (mesmo lendo os jornais diariamente). Estava com saudade daqui.
Logo haverá poemas novos na área. Enquanto isso, mais um da arca:
Reencontro
Vinte anos entre nós
E você ainda me faz estremecer
Minha aura, se é que ela existe,
torna-se palpável à minha volta
e acaricia seus cabelos, enternecida,
enquanto seus dedos perfeitos
emolduram, distraídos, a xícara.
Entre a fumaça preguiçosa do café
Seu sorriso de menina espreita
e eu tenho vontade de chorar
pelo nosso amor perdido
que jamais aconteceu.
Se o tempo nos pregou peças? Certamente,
Mas os cacos de sua vida
estão maravilhosamente alinhados e refeitos
Enquanto os meus espetam
como minha barba por fazer, minhas paixões por aparar
e minhas unhas (garras?) que corto antes
que as enterre nos próprios olhos, nas manhãs
em que a realidade teima por lançar
seus raios-tratores sobre meu catre.
Felizmente, você expulsa minha névoa mental
com seu riso inquebrantável
e, olhos para o céu, ergo minha xícara
e me pergunto,
intrigado e acompanhando sua alegria,
quando é que minha alma vai aprender
que não é pecado estar feliz.
Perdoe, assim, meu amor insistente:
ele não pode morrer
enquanto estiver a tomar café
com a Vida e o Sonho combinados
naquela manhã de retorno perene.
Logo haverá poemas novos na área. Enquanto isso, mais um da arca:
Reencontro
Vinte anos entre nós
E você ainda me faz estremecer
Minha aura, se é que ela existe,
torna-se palpável à minha volta
e acaricia seus cabelos, enternecida,
enquanto seus dedos perfeitos
emolduram, distraídos, a xícara.
Entre a fumaça preguiçosa do café
Seu sorriso de menina espreita
e eu tenho vontade de chorar
pelo nosso amor perdido
que jamais aconteceu.
Se o tempo nos pregou peças? Certamente,
Mas os cacos de sua vida
estão maravilhosamente alinhados e refeitos
Enquanto os meus espetam
como minha barba por fazer, minhas paixões por aparar
e minhas unhas (garras?) que corto antes
que as enterre nos próprios olhos, nas manhãs
em que a realidade teima por lançar
seus raios-tratores sobre meu catre.
Felizmente, você expulsa minha névoa mental
com seu riso inquebrantável
e, olhos para o céu, ergo minha xícara
e me pergunto,
intrigado e acompanhando sua alegria,
quando é que minha alma vai aprender
que não é pecado estar feliz.
Perdoe, assim, meu amor insistente:
ele não pode morrer
enquanto estiver a tomar café
com a Vida e o Sonho combinados
naquela manhã de retorno perene.
28.11.03
Férias!
Moçada, vou descansar um pouquinho da correria. Volto dia 15/12.
Fiquem bem.
(A foto é do Freefoto.com).

Moçada, vou descansar um pouquinho da correria. Volto dia 15/12.
Fiquem bem.
(A foto é do Freefoto.com).
27.11.03
Este também é d'antanho, mas até que combina com os temporais dos últimos dias no Rio ;-)
A tempestade
As palavras e as poesias vêm e vão
Como teu olhar perdido em meio à turba selvagem
Eu as guardo e cuspo sem o saber
Nas cordas de minha guitarra ensangüentada.
Se desistires do vento,
Não me terás também -- eu sou a Tempestade
E meus cabelos engolem teu amor em vagas
Arrastando-te para a loucura
Em teias de lábios rubros,
Em febres de noites sem luz.
A tempestade
As palavras e as poesias vêm e vão
Como teu olhar perdido em meio à turba selvagem
Eu as guardo e cuspo sem o saber
Nas cordas de minha guitarra ensangüentada.
Se desistires do vento,
Não me terás também -- eu sou a Tempestade
E meus cabelos engolem teu amor em vagas
Arrastando-te para a loucura
Em teias de lábios rubros,
Em febres de noites sem luz.
26.11.03
Algumas falas imperdíveis no filme "The Hours", de Virginia Woolf (Nicole Kidman).
If I were thinking clearly, Leonard, I would tell you that I wrestle alone in the dark, in the deep dark, and that only I can know. Only I can understand my condition. You live with the threat, you tell me you live with the threat of my extinction. Leonard, I live with it too.
This is my right; it is the right of every human being. I choose not the suffocating anesthetic of the suburbs, but the violent jolt of the Capital, that is my choice. The meanest patient, yes, even the very lowest is allowed some say in the matter of her own prescription. Thereby she defines her humanity. I wish, for your sake, Leonard, I could be happy in this quietness. But if it is a choice between Richmond and death, I choose death.
Leonard, you cannot find peace by avoiding life.
If I were thinking clearly, Leonard, I would tell you that I wrestle alone in the dark, in the deep dark, and that only I can know. Only I can understand my condition. You live with the threat, you tell me you live with the threat of my extinction. Leonard, I live with it too.
This is my right; it is the right of every human being. I choose not the suffocating anesthetic of the suburbs, but the violent jolt of the Capital, that is my choice. The meanest patient, yes, even the very lowest is allowed some say in the matter of her own prescription. Thereby she defines her humanity. I wish, for your sake, Leonard, I could be happy in this quietness. But if it is a choice between Richmond and death, I choose death.
Leonard, you cannot find peace by avoiding life.
25.11.03
Este é bem das antigas, escrito no começo da década de 80 num dia cinza perto de Itaipu, num lugar acolhedor, mas onde faltava uma pessoa essencial.
Bordado
E tudo fica imperceptivelmente quieto
E eu fico só
Bordando uma poesia quieta.
Não percebo quando chegas
Mas sei que não pretendes falar-me
Bem sei que não pretendes falar-me
E assim prossigo no vaivém da agulha.
Então, quando a cera da última vela se derrete,
E, missão cumprida, faço que vou me levantar,
Deténs-me e beijas-me as pálpebras pesadas
E, antes que eu possa retribuir,
Voltas a ser apenas chuva.
O que me resta então
Senão voltar a bordar poesias?
Bordado
E tudo fica imperceptivelmente quieto
E eu fico só
Bordando uma poesia quieta.
Não percebo quando chegas
Mas sei que não pretendes falar-me
Bem sei que não pretendes falar-me
E assim prossigo no vaivém da agulha.
Então, quando a cera da última vela se derrete,
E, missão cumprida, faço que vou me levantar,
Deténs-me e beijas-me as pálpebras pesadas
E, antes que eu possa retribuir,
Voltas a ser apenas chuva.
O que me resta então
Senão voltar a bordar poesias?
21.11.03
Outra da arca:
Sóis derramados
Tu te enganaste.
O que derramo pelas faces enegrecidas
Não são lágrimas
Mas reflexos do sol nascente
Tu não o sabes
Mas a marca de um destes brilhantes
Faz rebentar a taquicardia da espera
Pelo abraço do todo
Derramas sóis também?
Então vem e abraça-me
Se o universo não nos envolve, taciturno,
Talvez possamos criar um outro
No contratempo das batidas em nossos peitos.
Sóis derramados
Tu te enganaste.
O que derramo pelas faces enegrecidas
Não são lágrimas
Mas reflexos do sol nascente
Tu não o sabes
Mas a marca de um destes brilhantes
Faz rebentar a taquicardia da espera
Pelo abraço do todo
Derramas sóis também?
Então vem e abraça-me
Se o universo não nos envolve, taciturno,
Talvez possamos criar um outro
No contratempo das batidas em nossos peitos.
18.11.03
Um da arca, de que gosto:
Janeiro, 1
Dançar a noite inteira
E fazer amor com o dia amanhecendo, preguiçoso,
Empurrando sua milícia de nuvens douradas para o subúrbio...
Que melhor augúrio para a nova jornada
Do que teus beijos tépidos em minha boca e em meu peito
E tuas mãos explorando indóceis a selva de meus pêlos
enquanto o tecido branco desfalece por teus ombros abaixo,
gentilmente empurrado por meus dedos,
revelando uma alvorada desconhecida de Zaratustra
e muito mais bela do que a manhã
que nos deixam ver nossos postigos?
Teus olhos pequeninos e negros, tua face angulosa
Perdida em meio à eterna revolução de tuas melenas
Tudo em ti sorri enquanto o vagaroso expresso do prazer
Movimenta suas engrenagens, delicada e depois firmemente,
seguindo em direção às rubras pradarias do interior.
Quando, passado o momento supremo da Carne,
É alcançada a subestação do Espírito,
Derramas lágrimas de mel
e derretes por fim meu último gelo,
envolvendo-me em teus braços lisos e frementes.
Beijas-me então com o afinco que sempre te envolve após o amor
E bebes, vibrante, toda a minha alma
virando-a de uma vez só, como um uísque "cowboy".
Mais tarde, quando a observo dormitar
enquanto fumo um cigarro torto antes de me recolher,
Enterneço-me de repente e me pergunto
como pude, em outro tempo,
existir e caminhar sobre a terra sem ti.
Janeiro, 1
Dançar a noite inteira
E fazer amor com o dia amanhecendo, preguiçoso,
Empurrando sua milícia de nuvens douradas para o subúrbio...
Que melhor augúrio para a nova jornada
Do que teus beijos tépidos em minha boca e em meu peito
E tuas mãos explorando indóceis a selva de meus pêlos
enquanto o tecido branco desfalece por teus ombros abaixo,
gentilmente empurrado por meus dedos,
revelando uma alvorada desconhecida de Zaratustra
e muito mais bela do que a manhã
que nos deixam ver nossos postigos?
Teus olhos pequeninos e negros, tua face angulosa
Perdida em meio à eterna revolução de tuas melenas
Tudo em ti sorri enquanto o vagaroso expresso do prazer
Movimenta suas engrenagens, delicada e depois firmemente,
seguindo em direção às rubras pradarias do interior.
Quando, passado o momento supremo da Carne,
É alcançada a subestação do Espírito,
Derramas lágrimas de mel
e derretes por fim meu último gelo,
envolvendo-me em teus braços lisos e frementes.
Beijas-me então com o afinco que sempre te envolve após o amor
E bebes, vibrante, toda a minha alma
virando-a de uma vez só, como um uísque "cowboy".
Mais tarde, quando a observo dormitar
enquanto fumo um cigarro torto antes de me recolher,
Enterneço-me de repente e me pergunto
como pude, em outro tempo,
existir e caminhar sobre a terra sem ti.
13.11.03
Rebeca entrou na sala:
-- Mãe, cadê o DVD?
Jessica respondeu, já imaginando o que ela queria dizer:
-- Não é DVD que fala, menina, é controle remoto.
Rebeca continuou:
-- Não é isso. Cadê o DVD?
-- Menina, fica lá no quarto do seu pai, você não sabe?
-- Mas não está lá.
Jessica foi ao quarto e voltou.
-- Não está lá mesmo, mãe.
Wal foi verificar.
Tinham furtado o aparelho de DVD do meu quarto, que fica perto da janela (que dá para um corredor interno que leva a uma pequena vila). O aparelho estava lá uma hora antes.
Polvorosa.
Wal desceu até nossa vizinha, que mora atrás de nossa casa. Desconfiou do pessoal de uma obra que estava sendo feita ao lado. Logo viu uma escada no muro que dá para o pátio posterior de casa, para os aposentos de minha sogra. Comentou com a vizinha que ia chamar a polícia. Nossa vizinha, que não prima pela discrição, espalhou a notícia aos quatro ventos.
Pouco depois, Wal subiu ao pátio posterior e encontrou o aparelho de DVD dentro de uma bolsa molhada (estava chovendo) no quarto de minha sogra.
É ou não é um ladrão de cibergalinhas este mané?
-- Mãe, cadê o DVD?
Jessica respondeu, já imaginando o que ela queria dizer:
-- Não é DVD que fala, menina, é controle remoto.
Rebeca continuou:
-- Não é isso. Cadê o DVD?
-- Menina, fica lá no quarto do seu pai, você não sabe?
-- Mas não está lá.
Jessica foi ao quarto e voltou.
-- Não está lá mesmo, mãe.
Wal foi verificar.
Tinham furtado o aparelho de DVD do meu quarto, que fica perto da janela (que dá para um corredor interno que leva a uma pequena vila). O aparelho estava lá uma hora antes.
Polvorosa.
Wal desceu até nossa vizinha, que mora atrás de nossa casa. Desconfiou do pessoal de uma obra que estava sendo feita ao lado. Logo viu uma escada no muro que dá para o pátio posterior de casa, para os aposentos de minha sogra. Comentou com a vizinha que ia chamar a polícia. Nossa vizinha, que não prima pela discrição, espalhou a notícia aos quatro ventos.
Pouco depois, Wal subiu ao pátio posterior e encontrou o aparelho de DVD dentro de uma bolsa molhada (estava chovendo) no quarto de minha sogra.
É ou não é um ladrão de cibergalinhas este mané?
10.11.03
Este Cadafalso fez dois anos de vida no último dia 6 de novembro. Não pude assinalar a passagem no dia em questão por estar mergulhado no trabalho no Paraná. Mas agora vamos nessa!!!!! Yesss!!!!
Ao longo deste mês festivo estarei postando alguns poemas que marcaram os 730 dias de posts.
E vamos começar com o "Poema do Cadafalso", que deu origem ao nome do blog:
Poema do cadafalso
O que restou da última gota de desespero
Secou.
Deveríamos talvez esperar as rosas
Mas por que não semeá-las no vento?
Encontro-me em seu vácuo
Ejaculo minha autopiedade
Choro, emudeço, porcelana derretendo...
Olhos-espadas singrando mares violentos
Ecoando amores sem resposta
Angústias da tempestade rósea do cadafalso.
Meus icebergs são feitos de algodão
Quem bate neles não se arrebenta, é tragado
E serve de ídolo aos pagãos de meu corpo em agonia...
Liberdade, liberdade
Nas garrafas de vinho desgraçadas da noite!
Vem, vício macilento, enterra-me o ser,
Mata esse ardor da pele viva,
Destrói tudo!
Quando passar a tormenta,
Vou me encarcerar uma vez mais
Até vislumbrar, na podridão das paredes úmidas,
Um novo devir
Chave dos sentidos em ebulição,
Beijo louco do desejo no desejo
Brilhante gota do primeiro desespero.

Ao longo deste mês festivo estarei postando alguns poemas que marcaram os 730 dias de posts.
E vamos começar com o "Poema do Cadafalso", que deu origem ao nome do blog:
Poema do cadafalso
O que restou da última gota de desespero
Secou.
Deveríamos talvez esperar as rosas
Mas por que não semeá-las no vento?
Encontro-me em seu vácuo
Ejaculo minha autopiedade
Choro, emudeço, porcelana derretendo...
Olhos-espadas singrando mares violentos
Ecoando amores sem resposta
Angústias da tempestade rósea do cadafalso.
Meus icebergs são feitos de algodão
Quem bate neles não se arrebenta, é tragado
E serve de ídolo aos pagãos de meu corpo em agonia...
Liberdade, liberdade
Nas garrafas de vinho desgraçadas da noite!
Vem, vício macilento, enterra-me o ser,
Mata esse ardor da pele viva,
Destrói tudo!
Quando passar a tormenta,
Vou me encarcerar uma vez mais
Até vislumbrar, na podridão das paredes úmidas,
Um novo devir
Chave dos sentidos em ebulição,
Beijo louco do desejo no desejo
Brilhante gota do primeiro desespero.
7.11.03
De volta de Curitiba, onde fui cobrir um evento de software livre. Volto com muitas histórias interessantes, que sairão em breve. À noite, após entrevistas e palestras o dia todo, retornei ao Bar do Alemão, deliciosa instituição boêmia fincada no histórico Largo da Ordem, onde saboreei um chope batizado de Schwarzwald, que vinha com uma canequinha de aguardente alemã mergulhada nele. Excelente para rebater o frio de nove graus que fazia na capital paranaense.
A canequinha ficava de brinde para o conviva depois que o chope terminava. É claro que cheguei em casa com várias delas, cada uma com uma bandeirinha representando uma cidade da Alemanha.
Por falar nisso, a volta pareceu o filme "No limite da realidade": aterrissamos no Santos Dumont com chuva, raios e relâmpagos, depois de um vôo bem sacudido por turbulências entre SP e Rio. Quando desci do avião, bem que precisava de mais um Schwarzwald...
A canequinha ficava de brinde para o conviva depois que o chope terminava. É claro que cheguei em casa com várias delas, cada uma com uma bandeirinha representando uma cidade da Alemanha.
Por falar nisso, a volta pareceu o filme "No limite da realidade": aterrissamos no Santos Dumont com chuva, raios e relâmpagos, depois de um vôo bem sacudido por turbulências entre SP e Rio. Quando desci do avião, bem que precisava de mais um Schwarzwald...
3.11.03
Um chope. O sol. A brisa. E a gente dentro d'água, filosofando sobre tudo e nada. Assim foi meu sábado, na casa de uma prima. Um churrasquinho para rebater. E, de resto, ficar olhando o azul e perceber a luz se despedindo bem lentamente.
Pena que no fim do dia vieram raios, relâmpagos e trovões, anunciando a chuvarada que se estendeu até hoje. São Pedro tem um senso de humor esquisito mesmo.
Pena que no fim do dia vieram raios, relâmpagos e trovões, anunciando a chuvarada que se estendeu até hoje. São Pedro tem um senso de humor esquisito mesmo.
30.10.03
29.10.03
25.10.03
Visitas perfeitas
(um poema especialmente dedicado a Angel)
É nas histórias de suas páginas
que muita vez meu humor sai ao sol
e, curioso, abandona a bruma
que por vezes se entretece sobre as córneas
nas caminhadas solitárias na rede.
Ali, entre alfarrábios gozosos,
passo horas refletindo sobre vidas;
a vontade de poetar se encorpa
e meus lábios ciciam felizes.
Ó doce pintora de estados da mente:
como sabem a jardins suas letras elegantes!
Um brinde de absinto a elas
e uma vênia graciosa a sua lapidadora.
(um poema especialmente dedicado a Angel)
É nas histórias de suas páginas
que muita vez meu humor sai ao sol
e, curioso, abandona a bruma
que por vezes se entretece sobre as córneas
nas caminhadas solitárias na rede.
Ali, entre alfarrábios gozosos,
passo horas refletindo sobre vidas;
a vontade de poetar se encorpa
e meus lábios ciciam felizes.
Ó doce pintora de estados da mente:
como sabem a jardins suas letras elegantes!
Um brinde de absinto a elas
e uma vênia graciosa a sua lapidadora.
24.10.03
Peço licença para republicar um poema aqui. É sobre como a gente se sente ao perder um amigo, especialmente quando a culpa é nossa.
Perder amigos
Perder amigos
É como perder um documento de identidade
Do qual não existe segunda via;
É a nossa foto que está ali,
Sulcada com microinstantes de prazer e dor
-- E ninguém sabe onde está o negativo ou como revelá-lo.
Em nossa assinatura se escondem gotículas de sangue e paixão,
E na filiação está escrito Esperança e Lealdade em ouro
Ou talvez ouro de tolo.
Perder amigos é perder uma fatia de alma esburacada
Pelos dias que roem nossas convicções.
Dize-me quantos amigos perdeste
E eu te direi o quanto envelheceste.
Perder amigos
Perder amigos
É como perder um documento de identidade
Do qual não existe segunda via;
É a nossa foto que está ali,
Sulcada com microinstantes de prazer e dor
-- E ninguém sabe onde está o negativo ou como revelá-lo.
Em nossa assinatura se escondem gotículas de sangue e paixão,
E na filiação está escrito Esperança e Lealdade em ouro
Ou talvez ouro de tolo.
Perder amigos é perder uma fatia de alma esburacada
Pelos dias que roem nossas convicções.
Dize-me quantos amigos perdeste
E eu te direi o quanto envelheceste.
21.10.03

É com muito orgulho que vou contar isto a vocês: este guardião do Cadafalso foi o segundo lugar no concurso de narrativas curtas Haroldo Maranhão, organizado pela Meg. E isto entre mais de 300 inscritos. Não podia desejar maior honra e estou muito feliz e agradecido. O texto agraciado foi o Miniconto do desconforto número 5, que rebatizei de "A decisão" para a competição. Eis o texto:
"A nevasca seguia virulenta lá fora; dentro, o troar dos aplausos era inesgotável, irreprimível. Chamado ao palco, os gritos de "O autor! O autor!" transformando-o num títere gigante, postou-se no proscênio, como fizera nos últimos anos, impecavelmente elegante na capa Inverness e tirando da cigarreira dourada um dos incontáveis cigarros que o acompanhavam após os jantares no Savoy.
Ao dar a primeira tragada, viu na quarta fileira a Desgraça aplaudindo de pé, num longo vestido negro adornado por um único rubi cor de sangue. Naquela noite, decidiu: deixaria a vida de dissipação e recolher-se-ia num mosteiro, onde escreveria suas melhores obras, frutos da reflexão de que tanto precisava.
Mas a manhã surgiu magnífica, sem uma nuvem no céu, e lhe trouxe agradável companhia. Sentia-se novo, e saiu para passear em seu cabriolé de plantão. Anos depois, na prisão, falido, recordaria: fora a Beleza que o lançara ao abismo."
17.10.03
Lembrete: amanhã no Armazém do Rio, no Cais do Porto, o lançamento do site/revista Paralelos, projeto nota mil do querido Augusto Sales. A partir das 17 horas. Todos lá!
A prece pagã de Robert Wilde
A vida é avara para um coração
de código-fonte aberto.
O fantasma de Scrooge
é o único que aparece
para os objetos da paixão desenfreada
e lhes dá conselhos vis
de separação
de cartas-punhais
de poupança resplendente
em vez de entrega.
Eis-me sozinho, ó Afrodite:
para que me seduzes das alturas
se no fim sou sempre cuspido
como um caroço amargo?
A vida é avara para um coração
de código-fonte aberto.
O fantasma de Scrooge
é o único que aparece
para os objetos da paixão desenfreada
e lhes dá conselhos vis
de separação
de cartas-punhais
de poupança resplendente
em vez de entrega.
Eis-me sozinho, ó Afrodite:
para que me seduzes das alturas
se no fim sou sempre cuspido
como um caroço amargo?

Estive neste pedacinho de éden, onde funciona um pólo de tecnologia no estado do Rio. Fica aqui.
Serviu para me fazer voltar a cantar, mentalmente: "a vida é bela/só nos resta viver".
14.10.03
Eleanor of Aquitaine: What would you have me do? Give out? Give up? Give in?
Henry II, King of England: Give me a little peace.
Eleanor of Aquitaine: A little? Why so modest? How about eternal peace? Now there's a thought.
(Katharine Hepburn e Peter O'Toole, como Eleonora de Aquitânia e seu marido Henrique II da Inglaterra, em "O leão no inverno")
Henry II, King of England: Give me a little peace.
Eleanor of Aquitaine: A little? Why so modest? How about eternal peace? Now there's a thought.
(Katharine Hepburn e Peter O'Toole, como Eleonora de Aquitânia e seu marido Henrique II da Inglaterra, em "O leão no inverno")
Often, on returning home from one of those mysterious and prolonged absences that gave rise to such strange conjecture among those who were his friends, or thought that they were so, he himself would creep upstairs to the locked room, open the door with the key that never left him now, and stand, with a mirror, in front of the portrait that Basil Hallward had painted of him, looking now at the evil and aging face on the canvas, and now at the fair young face that laughed back at him from the polished glass.
Oscar Wilde, "The picture of Dorian Gray"
Oscar Wilde, "The picture of Dorian Gray"
9.10.03
Às vezes uma viagem de trabalho pode ser um oportuno distanciamento dos problemas cotidianos. Em especial se você pode chegar na noite anterior à missão propriamente dita e descansar um pouco num hotel. A gente fica um pouco com a gente mesmo e experimenta a essência dos dois lados da solidão: aquele em que, digamos, se saboreia sozinho um jantar, parando para filosofar em silêncio entre uma garfada e outra, ou para explorar os arredores desconhecidos num passeio sem destino. E aquele em que sentamos na cama, controle remoto na mão, e nos damos conta de como, no fundo, os quartos de hotel são todos iguais; de como a televisão pode ser aquele abismo amorfo que nos olha de volta; de como fazem falta as trapalhadas de sua família na periferia daquele filme denso a que você quer assistir apenas para entrar em contato com suas emoções perdidas no tempo.
Então, liga-se para casa, meio que tentando esconder a própria aflição, e ouve-se do outro lado da linha a voz da filha entre risadas e traquinagens -- o som da despreocupação absoluta. E pronto, estamos salvos.
Então, liga-se para casa, meio que tentando esconder a própria aflição, e ouve-se do outro lado da linha a voz da filha entre risadas e traquinagens -- o som da despreocupação absoluta. E pronto, estamos salvos.
7.10.03
Dias 16, 17, 18 e 19 de outubro vai rolar no Armazém do Rio o evento "Primavera dos Livros", com palestras, rodas de leitura, shows e estandes de várias editores. Quem curte literatura deve ficar ligado. No dia 18, sábado, às 19h, pretendo dar um pulo até lá para prestigiar minhas queridas Alessandra Archer e Crib Tanaka, que estarão lendo alguns trechos de seus escritos. E de repente vou ler algumas coisas minhas também ;-). Mestre Augusto Sales, o homem do Falaê!, também estará no programa, falando sobre e-zines e blogs, no mesmo dia, às 17h30. Ele está montando a revista/site "Paralelos", que vai reunir alguns dos antigos colaboradores do Falaê!.
3.10.03

Eu com Tia Cora, que prestigiou os coleguinhas no Prêmio Imprensa Embratel. A festa foi muito divertida.
Foto by Nokia 7650 da Miss Monteiro.
2.10.03
Quero dançar com você a noite toda, de preferência com o Gustavo restabelecido e cuidando das carrapetas com aquele repertório de guitarras divinas; quero olhar nos seus olhos, pousar sua mão em meu peito e esquecer todas as obrigações, as rotinas estereotipadas e a vida à la Pasteur que nos foi dado viver. Não quero lhe dizer uma palavra além destas linhas, apenas beijar seu pescoço e seus ombros em transe e descansar em seu regaço no fim da longa noite de lua nova.
Reconheça, pelo menos esta noite, que nossas almas foram prometidas no Gênesis. E entregue-se ao júbilo.
Reconheça, pelo menos esta noite, que nossas almas foram prometidas no Gênesis. E entregue-se ao júbilo.
30.9.03
29.9.03
No debate sobre o uso ou não do Exército para combater o crime nas ruas do Rio, os que são contra imaginam os militares como um "último recurso". Sinceramente, já passou da hora do último recurso. Além do mais, quando é que a gente vai reconhecer que está vivendo uma forma de guerra? Pois se a população anda amedrontada... Meus pais chegaram ao extremo de não sair mais à noite para nada. E olha que moram em Niterói, onde a violência ainda não atingiu o patamar do Rio.
É preciso dar uma resposta rápida à audácia do crime organizado. E acho que o Exército tem um papel aí, sim. Aliás, por falar nisso, acho um absurdo o sucateamento a que as Forças Armadas vêm sendo submetidas desde o governo anterior.
É preciso dar uma resposta rápida à audácia do crime organizado. E acho que o Exército tem um papel aí, sim. Aliás, por falar nisso, acho um absurdo o sucateamento a que as Forças Armadas vêm sendo submetidas desde o governo anterior.
26.9.03
A palestra de ontem no Rio Design Barra correu bem. Fiz uma introdução ao tema do software livre, explicando seus conceitos e sua história, e em seguida Marcos Tadeu, ajudado pelo analista de sistemas Bruno Collovini, explorou a parte mais técnica do sistema GNU-Linux. A platéia respondeu, fazendo todo tipo de pergunta, algumas bastante específicas. O debate foi muito interessante, porque a velha questão Windows versus Linux foi abordada por espectadores usuários de um e de outro, que intercambiaram argumentos diversos para cada lado. Encerramos com um sorteio de broches do Tux, o pingüim-símbolo do Linux, e depois houve uma animada confraternização no Sushi Barra, restaurante japonês no shopping e centro comercial Downtown, que se estendeu até uma da madruga.
Na foto abaixo, tirada pelo Bruno, eu e Marcos nos extremos do palco e em primeiro plano a Elisinha, que gentilmente me ajudou a distribuir os números do sorteio.
Na foto abaixo, tirada pelo Bruno, eu e Marcos nos extremos do palco e em primeiro plano a Elisinha, que gentilmente me ajudou a distribuir os números do sorteio.

25.9.03
Moçada, é hoje o papo sobre software livre e segurança que farei lá no Rio Design Barra (Av. das Américas, 7777, Barra) junto com o expert Marcos Tadeu von Lutzow Vidal.
Espero vocês lá, a partir das 20h!
Espero vocês lá, a partir das 20h!
23.9.03

(reprodução do site oficial do GNU/Linux)
Tá lá na Cora, então reproduzo aqui:
"Vida Digital
Essa semana, é a vez do André Machado: nosso intrépido repórter e o engenheiro Marcos Tadeu Vidal, professor de engenharia de telecomunicações e diretor da consultoria de segurança em TI V2R, vão falar sobre software livre e segurança no próximo encontro no Rio Design Barra. Quinta-feira, dia 25, às 20hs."
19.9.03
18.9.03
O presidente quer botar mais dinheiro em circulação no país diminuindo a conta-gotas os juros e autorizando empréstimos no contracheque.
Fala sério.
Qualquer empréstimo é por definição encalacrante. Acreditem, eu falo por experiência própria.
Por que o governo não demonstra que pensa um pouco nos trabalhadores e estuda para valer uma política salarial, ao invés de largar a gente na chamada "livre negociação"? (Livre só para os donos da $$$, é claro.) Com um salário decente, a gente volta a ser consumidor de verdade e não fica pondo a mesa de casa igualmente a conta-gotas, esticando o ordenado defasado há quinhentos anos.
Dá uma raiva danada ver que nada, absolutamente nada mudou este ano. Nem parece que vai mudar.
Quando foi a última vez que vocês gastaram um dinheirinho sossegados, sem pensar nas conseqüências? No meu caso, isso foi no governo Sarney.
Minha paciência está acabando.
Fala sério.
Qualquer empréstimo é por definição encalacrante. Acreditem, eu falo por experiência própria.
Por que o governo não demonstra que pensa um pouco nos trabalhadores e estuda para valer uma política salarial, ao invés de largar a gente na chamada "livre negociação"? (Livre só para os donos da $$$, é claro.) Com um salário decente, a gente volta a ser consumidor de verdade e não fica pondo a mesa de casa igualmente a conta-gotas, esticando o ordenado defasado há quinhentos anos.
Dá uma raiva danada ver que nada, absolutamente nada mudou este ano. Nem parece que vai mudar.
Quando foi a última vez que vocês gastaram um dinheirinho sossegados, sem pensar nas conseqüências? No meu caso, isso foi no governo Sarney.
Minha paciência está acabando.
17.9.03
De Arnaldo Jabor, ontem, sublime:
Isso: felicidade e medo, a sensação de tocar por instantes um mistério sempre movente, como um fotograma que pára por um instante e logo se move na continuação do filme. Sempre senti isso em cada visão de mulheres que amei: um rosto se erguendo da areia da praia, uma mulher fingindo não me ver, mas vendo-me de costas num escritório do Rio... São momentos em que a “máquina da vida” parece se explicar, como se fosse uma lembrança do futuro, como se eu me lembrasse ali do que iria viver.
Esses frêmitos de amor acontecem quando o “eu” cessa, por brevíssimos instantes, e deixamos o outro ser o que é em sua total solidão. Vemos um gesto frágil, um cabelo molhado, um rosto dormindo, e isso desperta em nós uma espécie de “compaixão” pelo nosso próprio desamparo, entrevisto no outro.
Isso: felicidade e medo, a sensação de tocar por instantes um mistério sempre movente, como um fotograma que pára por um instante e logo se move na continuação do filme. Sempre senti isso em cada visão de mulheres que amei: um rosto se erguendo da areia da praia, uma mulher fingindo não me ver, mas vendo-me de costas num escritório do Rio... São momentos em que a “máquina da vida” parece se explicar, como se fosse uma lembrança do futuro, como se eu me lembrasse ali do que iria viver.
Esses frêmitos de amor acontecem quando o “eu” cessa, por brevíssimos instantes, e deixamos o outro ser o que é em sua total solidão. Vemos um gesto frágil, um cabelo molhado, um rosto dormindo, e isso desperta em nós uma espécie de “compaixão” pelo nosso próprio desamparo, entrevisto no outro.
15.9.03
12.9.03
Niver de Mr. Balbio hoje. Vai ter festa. E o fim de semana vai começar... Só amanhã tem uns três agitos para ir. Isso é que é sábado ;-)
Dia de correria e fechamento hoje no caderninho. A correria foi maior do que a habitual porque Mr. Balbio, Elis e eu fomos fotografados e filmados para a final do V Prêmio de Imprensa Embratel, ao qual concorrermos com um especial sobre telefonia móvel que fizemos em 2002.
Elis e eu também cortamos um dobrado esta semana porque aproveitamos para nos atualizar e fizemos o curso de mestre Laércio Vasconcelos para montagem de micros de última geração. Elisinha e eu desmontamos e montamos do zero um micro que funcionou direitinho, na prova final. Já dá para ajeitar a placa de som de lá de casa ;-))
E é claro que saímos de lá com altas idéias para pautas... Imagine se dois curiosos como nós não iam pensar em mil textos possíveis.
Dia de correria e fechamento hoje no caderninho. A correria foi maior do que a habitual porque Mr. Balbio, Elis e eu fomos fotografados e filmados para a final do V Prêmio de Imprensa Embratel, ao qual concorrermos com um especial sobre telefonia móvel que fizemos em 2002.
Elis e eu também cortamos um dobrado esta semana porque aproveitamos para nos atualizar e fizemos o curso de mestre Laércio Vasconcelos para montagem de micros de última geração. Elisinha e eu desmontamos e montamos do zero um micro que funcionou direitinho, na prova final. Já dá para ajeitar a placa de som de lá de casa ;-))
E é claro que saímos de lá com altas idéias para pautas... Imagine se dois curiosos como nós não iam pensar em mil textos possíveis.
9.9.03
"The first and most important rule to observe...is to use our entire forces with the utmost energy. The second rule is to concentrate our power as much as possible against that section where the chief blows are to be delivered and to incur disadvantages elsewhere, so that our chances of success may increase at the decisive point. The third rule is never to waste time. Unless important advantages are to be gained from hesitation, it is necessary to set to work at once. By this speed a hundred enemy measures are nipped in the bud, and public opinion is won most rapidly. Finally, the fourth rule is to follow up our successes with the utmost energy. Only pursuit of the beaten enemy gives the fruits of victory."
(Von Clausewitz)
(Von Clausewitz)
8.9.03

Como o diabo gosta, no aniversário da minha querida Ariadne (esq.), junto com a Glorinha, no agito do Casarão Hermès, na Glória. A semana passada foi realmente uma boêmia só. A foto é da doce Elis Monteiro.
5.9.03
A seta de Eros
Eu a observo
e reflito: como fazê-la entender
que sou eu quem procura?
que somos as peças que se encaixam
em nossas almas tateantes?
Relato maravilhas
para entreter sua noite sem fim.
Scheherazadicamente
forjo as tessituras das histórias
como quem maneja uma harpa de cristal quebradiço.
Mas os círculos negros de seus olhos me perturbam
e sobrevém o silêncio fatal
em que as idéias se afogam
e resta apenas a seta de Eros a fustigar os mamilos.
Ah, será uma longa jornada até o entendimento.
E provavelmente ele virá quando a primeira terra
cair sobre o esquife do poeta.
Eu a observo
e reflito: como fazê-la entender
que sou eu quem procura?
que somos as peças que se encaixam
em nossas almas tateantes?
Relato maravilhas
para entreter sua noite sem fim.
Scheherazadicamente
forjo as tessituras das histórias
como quem maneja uma harpa de cristal quebradiço.
Mas os círculos negros de seus olhos me perturbam
e sobrevém o silêncio fatal
em que as idéias se afogam
e resta apenas a seta de Eros a fustigar os mamilos.
Ah, será uma longa jornada até o entendimento.
E provavelmente ele virá quando a primeira terra
cair sobre o esquife do poeta.
4.9.03
Encontro ontem, na Cobal do Humaitá, de veteranos da Escola de Comunicação da UFRJ, a saudosa ECO, que era um agito só no começo dos anos 80. Havia representantes das turmas de agosto/80 e março/81 (a minha), e o chope foi para lá de divertido. O mote foi a visita da querida amiga Denise Marcolino, hoje radicada em SP, a estas praias cariocas. Estavam lá José Figueiredo, o eterno Fig, Júlia, Carter Anderson, Angélica, Ricardo Cabral, Márcia Elena, Dudu Feijó, Augusto e outros convivas. Arnaldo Bloch deu também uma rápida passada na área. Planeja-se uma grande festa ecoína em novembro, me informa o Fig.
30.8.03
Encontro e instante
(para alguém que é pura vida, em todos os sentidos)
Despertou devagar numa praia grega
a lembrança do vinho com mel ainda em seus olhos
a dor de abandonar o sonho
como afastamos o cobertor tépido ao laçar a vida
todos os dias
para que nos arraste.
olhou o oceano perfeito
e sentiu-se velho.
então, sem mais, ela saiu da água
e mirou-o com toda a sua juventude irrequieta.
Ela se aproximou e sorriu, curiosa.
Sua pele era límpida como o marfim de Calecute
e suas palavras, melífluas e ansiosas
como o canto de certos pássaros
que ainda não perceberam seu cativeiro.
Ele ouviu maravilhado suas perguntas
e pensou em responder por artifícios.
Mas qual.
Lembrou-se de sua própria juventude distante
E preferiu fazê-la rir.
Ali, na areia onde pisara Apolo,
sua vida mudou de tom por um instante.
E ela o presenteou
com o esquecimento.
(para alguém que é pura vida, em todos os sentidos)
Despertou devagar numa praia grega
a lembrança do vinho com mel ainda em seus olhos
a dor de abandonar o sonho
como afastamos o cobertor tépido ao laçar a vida
todos os dias
para que nos arraste.
olhou o oceano perfeito
e sentiu-se velho.
então, sem mais, ela saiu da água
e mirou-o com toda a sua juventude irrequieta.
Ela se aproximou e sorriu, curiosa.
Sua pele era límpida como o marfim de Calecute
e suas palavras, melífluas e ansiosas
como o canto de certos pássaros
que ainda não perceberam seu cativeiro.
Ele ouviu maravilhado suas perguntas
e pensou em responder por artifícios.
Mas qual.
Lembrou-se de sua própria juventude distante
E preferiu fazê-la rir.
Ali, na areia onde pisara Apolo,
sua vida mudou de tom por um instante.
E ela o presenteou
com o esquecimento.
Blogs, Universos em Prosa, um livro digital copyleft
Uma idéia muito legal da Rossana, de que tive a honra de participar com uma pequena declaração.

Uma idéia muito legal da Rossana, de que tive a honra de participar com uma pequena declaração.
29.8.03
Existem amigos que nos comovem mesmo à distância. É o caso de Alessandra Archer, com quem me sinto absolutamente incapaz de ficar chateado, mesmo sem vê-la há quase três meses. É impossível não adorar alguém capaz de escrever algo assim:
"Ela precisava falar sobre isso. Queria dizer que os sons a olhavam cabisbaixos. Às vezes desconfiavam que ela os ouvia. Mas como, se é absolutamente surda? Com os olhos castanhos avermelhados de choro ela os olhava sem calor. Queria ouvi-los, sim. Esforçava-se para entendê-los. E tudo o que conseguia era imprimir papéis e mais papéis cheios de histórias e poesias. Juntava letras com um teclado e considerava muito mais fácil do que abrir sua boca e cuspir palavras. Elaborava-as, buscando explicações para tudo o que não conseguiria nunca desenrolar em sua mudez doentia. talvez por isso seus textos vinham sempre com as mais belas e ousadas palavras. Contos tingidos de verde, aromatizados ou com sabor chocolate. Mas agora estava com um nó na garganta e só dispunha de cinco minutos para digitar qualquer coisa rápida, qualquer coisa que a desengasgasse por algum tempo. E iria fazê-lo. E estava certa de que conseguiria. E foi por isso que sua mãe a ouviu, pela primeira vez, dizendo que a amava."
Oh boy.
"Ela precisava falar sobre isso. Queria dizer que os sons a olhavam cabisbaixos. Às vezes desconfiavam que ela os ouvia. Mas como, se é absolutamente surda? Com os olhos castanhos avermelhados de choro ela os olhava sem calor. Queria ouvi-los, sim. Esforçava-se para entendê-los. E tudo o que conseguia era imprimir papéis e mais papéis cheios de histórias e poesias. Juntava letras com um teclado e considerava muito mais fácil do que abrir sua boca e cuspir palavras. Elaborava-as, buscando explicações para tudo o que não conseguiria nunca desenrolar em sua mudez doentia. talvez por isso seus textos vinham sempre com as mais belas e ousadas palavras. Contos tingidos de verde, aromatizados ou com sabor chocolate. Mas agora estava com um nó na garganta e só dispunha de cinco minutos para digitar qualquer coisa rápida, qualquer coisa que a desengasgasse por algum tempo. E iria fazê-lo. E estava certa de que conseguiria. E foi por isso que sua mãe a ouviu, pela primeira vez, dizendo que a amava."
Oh boy.
27.8.03
Mais uma ida e volta a Sampa, ontem, a trabalho. Estava um frio danado por lá. Felizmente o evento que fui cobrir aconteceu num hotel.
O curioso foi quando recebi o código para minha passagem para a ponte aérea: ele terminava com as letras "fique". Se eu fosse supersticioso, não voava de jeito nenhum. Mas, como acredito que a hora de se ir deste mundo já está registrada num alfarrábio qualquer em outra dimensão, não hesitei e segui em frente.
Valeu a pena: o trabalho foi tranqüilo e a companhia, agradável. Revi, além dos coleguinhas de SP, a moçada de Brasília, Recife e Belo Horizonte.
O curioso foi quando recebi o código para minha passagem para a ponte aérea: ele terminava com as letras "fique". Se eu fosse supersticioso, não voava de jeito nenhum. Mas, como acredito que a hora de se ir deste mundo já está registrada num alfarrábio qualquer em outra dimensão, não hesitei e segui em frente.
Valeu a pena: o trabalho foi tranqüilo e a companhia, agradável. Revi, além dos coleguinhas de SP, a moçada de Brasília, Recife e Belo Horizonte.
25.8.03
21.8.03
20.8.03
Lonely
O ciúme agitou-se em meus rins
na alvorada de tua decisão;
eu a queria inteira
queria a chave criptográfica de tua alma.
Mas quem há de ouvir os protestos de um poeta?
Quem leva a sério o encantador de palavras?
Teu amor me impregnou; foi meu erro.
E agora tu beijas teu futuro
e eu fito o horizonte
e choro sobre os palácios de brisa que ergui.
O ciúme agitou-se em meus rins
na alvorada de tua decisão;
eu a queria inteira
queria a chave criptográfica de tua alma.
Mas quem há de ouvir os protestos de um poeta?
Quem leva a sério o encantador de palavras?
Teu amor me impregnou; foi meu erro.
E agora tu beijas teu futuro
e eu fito o horizonte
e choro sobre os palácios de brisa que ergui.
18.8.03
11.8.03
Eu não costumo postar aqui qualquer tipo de corrente no estilo "fofinha". Mas a Alesinha, uma figura maravilhosa, me mandou um email que realmente me fez rir. Vou dividi-lo com vocês:
"Trate seu amor como você trata seu melhor amigo".
Sei que isso parece falta de romantismo, mas é o conselho mais certeiro.
Não era você que estava a fim de uma relação serena e plenamente satisfatória? Taí o caminho.
Vamos tentar elucidar como isso se dá na prática.
(...)
Você foi convidado para o casamento de uma prima distante que mora onde Judas perdeu as botas, você tem que ir porque ela chamou você pra padrinho.
Como é que os casais costumam combinar isso?
"Não tem como escapar, você vai comigo e pronto".
Ou seja, um põe o outro no programa de índio e nem quer saber de conversa.
É assim que você convidaria seu melhor amigo? Não. Você diria:
"Putz, tenho uma roubada pela frente que você não imagina. Me dá uma força, vem
comigo, ao menos a gente dá umas risadas...".
Ficou bem mais simpático, não ficou?
Como esta, tem milhões de situações chatas que você pode aliviar, apenas moderando o tom das palavras.
Pro seu marido:
"Você nunca repara em mim, não deu pra notar que cortei o cabelo? Será que sou invisível?"
Mas pra sua melhor amiga: "Ai, pelo visto meu cabelo ficou medonho e você está me poupando, né? Pode dizer a verdade, eu agüento".
Pra sua mulher:
"Você já se deu conta da podridão que está este sofá? Não dá pra ver que está na hora de trocar o tecido?"
Mas pra sua melhor amiga:
"Deixa a pizza por minha conta, eu pago, assim você economiza pra lavar o sofá. A não ser que este seja um novo estilo de decoração..." Risos, risos, risos.
"Trate seu amor como você trata seu melhor amigo".
Sei que isso parece falta de romantismo, mas é o conselho mais certeiro.
Não era você que estava a fim de uma relação serena e plenamente satisfatória? Taí o caminho.
Vamos tentar elucidar como isso se dá na prática.
(...)
Você foi convidado para o casamento de uma prima distante que mora onde Judas perdeu as botas, você tem que ir porque ela chamou você pra padrinho.
Como é que os casais costumam combinar isso?
"Não tem como escapar, você vai comigo e pronto".
Ou seja, um põe o outro no programa de índio e nem quer saber de conversa.
É assim que você convidaria seu melhor amigo? Não. Você diria:
"Putz, tenho uma roubada pela frente que você não imagina. Me dá uma força, vem
comigo, ao menos a gente dá umas risadas...".
Ficou bem mais simpático, não ficou?
Como esta, tem milhões de situações chatas que você pode aliviar, apenas moderando o tom das palavras.
Pro seu marido:
"Você nunca repara em mim, não deu pra notar que cortei o cabelo? Será que sou invisível?"
Mas pra sua melhor amiga: "Ai, pelo visto meu cabelo ficou medonho e você está me poupando, né? Pode dizer a verdade, eu agüento".
Pra sua mulher:
"Você já se deu conta da podridão que está este sofá? Não dá pra ver que está na hora de trocar o tecido?"
Mas pra sua melhor amiga:
"Deixa a pizza por minha conta, eu pago, assim você economiza pra lavar o sofá. A não ser que este seja um novo estilo de decoração..." Risos, risos, risos.
8.8.03
Também dei um alô para minha querida Alessandra Archer, que não vejo desde junho. É uma vergonha o tempo que a gente passa longe dos amigos neste mundo corrido e cercado de tarefas e dívidas por todos os lados...
Acabei de falar por telefone com o Gustones, que está acamado, praticamente imobilizado, por uma hérnia de disco terrível. Espero que você fique bom logo, meu caro, porque está fazendo falta para caramba.
7.8.03
Vai com Deus, dr. Roberto. Faço minhas as palavras do Chico Anysio: que o Espírito ilumine seus herdeiros e lhes dê a mesma sabedoria, a mesma capacidade administrativa que o senhor teve.
* * *
A tristeza no Globo hoje me lembra a tristeza da Manchete quando perdeu Adolpho Bloch em 19 de novembro de 1995. Nunca mais vou esquecer essa data, porque no dia seguinte, meu sogro, que eu adorava, teve um enfarte fulminante. Foi um dos piores momentos da minha vida.
* * *
A tristeza no Globo hoje me lembra a tristeza da Manchete quando perdeu Adolpho Bloch em 19 de novembro de 1995. Nunca mais vou esquecer essa data, porque no dia seguinte, meu sogro, que eu adorava, teve um enfarte fulminante. Foi um dos piores momentos da minha vida.
6.8.03
Transcrito do Globo de hoje. Pode ter passado desapercebido com Elio Gaspari e Zuenir Ventura na mesma página:
"Contas que não fecham
Antonio Conrado
Se você é um trabalhador da iniciativa privada e começou sua vida profissional antes de junho de 1989, contribuindo para receber 20 salários-mínimos quando se aposentasse, fique perplexo com o “espetáculo de injustiça” a que estamos assistindo.
Recorrendo a analogias na busca de maior clareza, pergunto se é justo você comprar, por exemplo, um apartamento de cinco quartos, pagar por diversos anos a respectiva prestação e, ao longo do tempo, o incorporador unilateralmente reduzir o tamanho do apartamento e a respectiva prestação para dois quartos.
Pergunto, respeitosamente, aos representantes dos três poderes da República que leram até aqui este despretensioso artigo: o que V. Ex. decidiria se um reclamante demandasse ou a manutenção do inicialmente acordado (cinco quartos) ou a devolução das prestações pagas em excesso (cinco versus dois quartos), ou algum critério mais justo tipo pró-rata?
Pois bem, acompanho com interesse as atuais pertinentes e necessárias discussões da reforma da Previdência e o direito de diferentes grupos defenderem os seus pleitos. É a democracia em pleno funcionamento.
Em nenhum momento, porém, li ou escutei algum membro de um partido político, de uma central sindical, do Judiciário, do Executivo, que se indignasse com a usurpação do direito e/ou expectativa de direito, nem com a apropriação indébita das contribuições feitas pelos trabalhadores que iniciaram, como disse anteriormente, sua vida profissional como empregado de uma empresa privada e pagando, insisto, contribuindo, para ter 20 salários de aposentadoria. Hoje, o teto dessas aposentadorias corresponde a 7,8 salários-mínimos.
Há jurisprudência firmada no sentido de que as condições de aposentadoria são definidas pela legislação em vigor na data de início da dita cuja. Portanto, hipoteticamente, por absurdo e no limite, se você quiser trabalhar 35 anos, e após 34 anos e 11 meses (a um mês de sua aposentadoria) mudasse a legislação com redução de sua pensão, seu benefício seria o novo valor e você receberia um sonoro adeus para aquelas contribuições pagas a maior.
Está aí uma bandeira que considero justa e que, respeitosamente, gostaria que fosse defendida pelos três poderes e pelas centrais sindicais: ou a devolução das contribuições corrigidas pagas a maior, ou a correção do benefício segundo um critério pró-rata em relação a todas as contribuições feitas. Teria uma sensação de proteção maior vendo um “radical” subindo em um caminhão de som e uma ameaça de greve de uma central sindical nessa defesa.
E para aqueles mais ligados à vida político-partidária, sugiro que alguém crie o PTIPRI, Partido dos Trabalhadores da Iniciativa Privada. Para os mais ligados ao mundo sindical, a fundação da CUTIPRI, Central Única dos Trabalhadores da Iniciativa Privada. Talvez as adesões fossem significativas."
"Contas que não fecham
Antonio Conrado
Se você é um trabalhador da iniciativa privada e começou sua vida profissional antes de junho de 1989, contribuindo para receber 20 salários-mínimos quando se aposentasse, fique perplexo com o “espetáculo de injustiça” a que estamos assistindo.
Recorrendo a analogias na busca de maior clareza, pergunto se é justo você comprar, por exemplo, um apartamento de cinco quartos, pagar por diversos anos a respectiva prestação e, ao longo do tempo, o incorporador unilateralmente reduzir o tamanho do apartamento e a respectiva prestação para dois quartos.
Pergunto, respeitosamente, aos representantes dos três poderes da República que leram até aqui este despretensioso artigo: o que V. Ex. decidiria se um reclamante demandasse ou a manutenção do inicialmente acordado (cinco quartos) ou a devolução das prestações pagas em excesso (cinco versus dois quartos), ou algum critério mais justo tipo pró-rata?
Pois bem, acompanho com interesse as atuais pertinentes e necessárias discussões da reforma da Previdência e o direito de diferentes grupos defenderem os seus pleitos. É a democracia em pleno funcionamento.
Em nenhum momento, porém, li ou escutei algum membro de um partido político, de uma central sindical, do Judiciário, do Executivo, que se indignasse com a usurpação do direito e/ou expectativa de direito, nem com a apropriação indébita das contribuições feitas pelos trabalhadores que iniciaram, como disse anteriormente, sua vida profissional como empregado de uma empresa privada e pagando, insisto, contribuindo, para ter 20 salários de aposentadoria. Hoje, o teto dessas aposentadorias corresponde a 7,8 salários-mínimos.
Há jurisprudência firmada no sentido de que as condições de aposentadoria são definidas pela legislação em vigor na data de início da dita cuja. Portanto, hipoteticamente, por absurdo e no limite, se você quiser trabalhar 35 anos, e após 34 anos e 11 meses (a um mês de sua aposentadoria) mudasse a legislação com redução de sua pensão, seu benefício seria o novo valor e você receberia um sonoro adeus para aquelas contribuições pagas a maior.
Está aí uma bandeira que considero justa e que, respeitosamente, gostaria que fosse defendida pelos três poderes e pelas centrais sindicais: ou a devolução das contribuições corrigidas pagas a maior, ou a correção do benefício segundo um critério pró-rata em relação a todas as contribuições feitas. Teria uma sensação de proteção maior vendo um “radical” subindo em um caminhão de som e uma ameaça de greve de uma central sindical nessa defesa.
E para aqueles mais ligados à vida político-partidária, sugiro que alguém crie o PTIPRI, Partido dos Trabalhadores da Iniciativa Privada. Para os mais ligados ao mundo sindical, a fundação da CUTIPRI, Central Única dos Trabalhadores da Iniciativa Privada. Talvez as adesões fossem significativas."
5.8.03
3.8.03
Não seja esposa, nem mãe hoje. Seja apenas aquela namorada serelepe que me tirou do sério milhões de vezes. Seja inconseqüente, exuberante, engraçada, impetuosa. Faz de conta que a gente não sabe como a história termina e ainda acredita que pode muito bem não haver outro encontro amanhã, pela razão mais frívola. Não fale de sua família, nem da minha. Deixe o exame de vista da caçula para lá. Esconda os mangás da adolescente, só pra provocá-la. Não faça as contas -- matemática é antitesão.
Apenas venha cá, me abrace e cante comigo: let it roll, babe, roll... all night long.
Apenas venha cá, me abrace e cante comigo: let it roll, babe, roll... all night long.
1.8.03
Estava vendo um show do Queen na TV madrugada dessas, com a banda no auge da forma, cheia de eletricidade em seu rock and roll, quando eles tocaram "Tie your mother down". Fiquei rindo sozinho, lembrando de um show a que assisti nos anos 90 no Circo Voador, com uma banda tocando uma versão brasileira bem-humorada desta música, chamada "Traia o maridão"...
Eu estive na coletiva da banda no Rock in Rio I, em janeiro de 1985. Dos quatro, o mais simpático foi de longe o guitarrista Brian May, contando o porre que tomara no avião. May sempre me pareceu um elfo tocando guitarra, com aquela altura toda. O dele é um dos timbres mais singulares do rock.
Eu estive na coletiva da banda no Rock in Rio I, em janeiro de 1985. Dos quatro, o mais simpático foi de longe o guitarrista Brian May, contando o porre que tomara no avião. May sempre me pareceu um elfo tocando guitarra, com aquela altura toda. O dele é um dos timbres mais singulares do rock.