11.7.02

Trechos de duas cartas das profundezas do Hades

I -- Um discípulo de Fausto conversa com sua alma corrompida

"Às vezes, seu velho ego
Volta para me assombrar
Diz coisas horríveis, me beija com lábios frios
Me embriaga de ódio, de tédio,
E depois volta para a sepultura de carne que habita.
Você é apenas um fantasma do que foi, ó minha alma
E eu a amo assim, apática, entrevada, morta em vida
Como a moldei, embevecido, com a matéria da minha vontade.
Mas seu velho ego é teimoso, volta sempre...
A noite parece estimulá-lo, como as marés,
E então sou eu que me escondo, viro tatu-bola,
Até a alvorada, que seduzi em segredo há tempos, voltar."

II -- De: Edgar Allan Poe. Para: Ligéia. Cc: Berenice

"Negra é a tinta com que me exponho
Negra é tua alma desalinhada
E tuas lágrimas que bruxuleiam
Pelas fissuras do horror em tua boca podre.

Treva! É em teu âmago
Que te toco, enojado
E deliciado
Como num século de sol morno
Como num dia de nuvens-magma
Como antes de olhar no espelho de Narciso.

Teus dentes
São como presas de vermes gigantes
Numa intempérie no deserto
Prontos para cravar-se em meus dendritos
Toda vez que tu sorris.

Esposa querida, prima desejada
Lapido meus textos
E assim te corto as palavras
Mato-te de êxtase metálico
Para que eu possa morrer aos poucos."

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