6.6.02

O DESTINO, O LIVRE-ARBÍTRIO E O DESEJO

CAPÍTULO XIX


Nos minutos seguintes, Daniela desfiou pelo que pareceu a ele uma eternidade as histórias mais maravilhosas que haviam surgido desde a aurora da humanidade. Lendas sumérias, egípcias e assírias desfilaram com garbo diante dos ouvidos agora maravilhados de Jon. Ele ficou sabendo também que fim levaram muitos dos mais belos mitos da Hélade, e no processo descobriu ainda um pouco mais das maravilhas do Velho Testamento; ouviu fascinado os encontros de Daniela com personagens tão díspares quando Gregor Samsa e Dorian Gray; e soube ainda que certos escritores desciam (ou subiam) tão profundamente em suas fantasias que por vezes acabavam no mesmo limbo, misturados com seus personagens e ambientes imaginários.
-- Joachim, meu "pai", é Jorge Luis Borges. E aquele moreno barbudo que você encontrou no elevador é Carlos Brito, um jovem escritor que se viu de repente vagando assustado por seu conto de mistério "A profecia".
-- Mas por que eu os vejo aqui?
-- Porque você já está envolvido comigo de algum modo, e a meio caminho da terra de ninguém. Então, algumas figuras interagem com você.
De repente Jon olhou em volta e se deu conta de que sua noção de realidade poderia estar toda errada.
-- E esse apartamento, existe? E você dando telefonemas, e a história de estudar moda... Eu já não sei mais o que é verdade ou mentira! -- exclamou.
Daniela pôs a mão em seu peito.
-- Calma. Como fiquei nesse limbo, não perdi contato com tudo. Esse é o apartamento em que moro, ou morei; ainda não sabem direito o que aconteceu comigo. E consigo falar por telefone com algumas amigas, mais sensitivas. Como aquela esotérica. Então dou a impressão de ainda estar por aí, embora não apareça, entendeu? Digo que estou doente, ou viajando...
-- E sua família? Você não tem família?
-- Eles moram longe, no interior de Santa Catarina. E, lembre-se, faz apenas algumas semanas que tudo rolou. A gente não se fala com freqüência.
-- E aquela história da noite de amor com pizza e vinho? Bastante real, não?
Ela sentiu o ciúme fervendo dentro do medo dele.
-- Perdoe... Eu... eu dormi com o visconde de Valmont, entende? Era impossível resistir... Por favor, entenda, naquela realidade você simplesmente se envolve, não há como ficar alheia...
Jon ficou quieto. Foi Daniela quem falou de novo:
-- Você ainda não acredita, não é? Olhe.

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